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Avanço do crime organizado

Por: Bruno Barra Gomes

Nos últimos anos, o Ministério Público brasileiro tem atuado de forma eficiente na investigação de crimes, reunindo provas que levam a condenação de pessoas envolvidas em grandes organizações criminosas.

Ordinariamente, a investigação de crimes no Brasil é exercida pelas Polícias Civis e pela Polícia Federal, órgãos do Poder Executivo que integram a chamada Polícia Judiciária e exercem a relevante função de elucidar crimes e apontar seus autores, merecendo o reconhecimento da sociedade.

Entretanto, a Polícia Judiciária por vezes encontra obstáculos na apuração de determinados crimes, principalmente em razão da falta de estrutura física e de pessoal e da indesejável interferência política. Tais fatores comprometem a eficiência da Polícia na repressão da corrupção, da criminalidade organizada, dos crimes eleitorais e dos crimes contra os Direitos Humanos.

Nesses casos, o Ministério Público, que é instituição autônoma e não subordinada a nenhum dos Poderes da República, pode e deve instaurar procedimentos de investigação criminal, seja para complementar o trabalho investigativo da Polícia, seja para conduzir por conta própria a apuração de crimes.

A Constituição Federal, ainda que implicitamente, atribuiu ao Ministério Público o poder de investigação criminal, ao incumbi-lo de propor ações penais, de instruir procedimentos administrativos e de exercer o controle externo da atividade policial. Por óbvio, a instituição responsável por formular a acusação em juízo deve ter a faculdade de colher as provas que embasarão futuras condenações.

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, a propósito, já reconheceram a legitimidade do poder investigatório do Ministério Público.

Diante desse quadro, o Ministério Público tem investido na criação e aparelhamento de órgãos especializados em inteligência e em investigações criminais, e obtido resultados significativos nos últimos anos.

Em Goiás, o Ministério Público Estadual presidiu investigações de grande relevância social. Merecem destaque as operações Fundo Corrosivo, que detectou fraudes na Secretaria Estadual de Saúde, Propina Verde, que desmantelou esquema de corrupção na Semarh, Biópsia, que investigou ilícitos no Hospital Araújo Jorge e na Associação de Combate ao Câncer em Goiás, Carta Marcada, que desvendou crimes praticados no Detran, e Cadeia do Crime, que desarticulou organizações criminosas que agiam de dentro do sistema prisional.

As investigações criminais exercidas por Promotores e Procuradores de Justiça são devidamente controladas pela Corregedoria-Geral do Ministério Público e pelo Conselho Nacional do Ministério Público, o qual regulamentou a forma e os prazos a serem observados na tramitação dos procedimentos de investigação criminal (PICs), por meio da Resolução nº 13/2006.

Não obstante a relevância do trabalho de investigação do Ministério Público, tramita no Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37/2011, estabelecendo que a investigação de crimes seja função privativa da Polícia Federal e das Polícias Civis. A proposta é do deputado federal Lourival Mendes, que é delegado de polícia no Maranhão, o que denota o viés corporativista do projeto.

Caso seja aprovada, a chamada PEC da Impunidade impedirá que outras instituições realizem investigações de fatos que configurem crimes, dentre elas a Receita Federal, o Coaf, o Banco Central, a Controladoria Geral da União e principalmente o Ministério Público da União e dos Estados.

Eventual monopólio da investigação pela Polícia Judiciária geraria um preocupante retrocesso institucional, num momento histórico em que a sociedade evolui a passos largos no sentido da democratização plena e exige pluralidade de instâncias para perseguir a responsabilização por infrações penais.

Alguns setores da sociedade civil organizada já perceberam o risco da aprovação da PEC 37, e têm se posicionado contrariamente à alteração do texto constitucional. A ONU, em relatório sobre crimes praticados contra os Direitos Humanos no Brasil, recomendou que o Ministério Público fosse estimulado a desenvolver investigações em face desses comportamentos delitivos. Recentemente, o jornal O Globo publicou o editorial Limitar o MP é incentivar impunidade, ressaltando que não se deve dar o monopólio das investigações ao Poder Executivo.

Em pesquisa de opinião realizada pelo Ibope em 2004, a maioria absoluta dos entrevistados defendeu o poder de investigação criminal do Ministério Público, sobretudo nos casos relacionados com a corrupção, com as organizações criminosas e nos casos envolvendo policiais. Apenas 4% dos entrevistados manifestaram-se a favor do monopólio da investigação criminal pela Polícia Judiciária.

A sociedade anseia por evolução no combate à criminalidade, o que não é possível quando se restringe a investigação criminal a um único órgão em cada unidade da federação. Certamente, a Polícia Judiciária deve ser fortalecida e valorizada, mas não por meio do monopólio da investigação criminal.

Espera-se que a PEC 37/2011 seja rejeitada no Congresso Nacional, para que o Ministério Público e outras instituições possam continuar exercendo, concorrentemente com a Polícia Judiciária, a relevante função de investigar infrações penais.

Bruno Barra Gomes é promotor de Justiça e diretor de Assuntos Institucionais da Associação Goiana do Ministério Público (AGMP)