Por: André Luis Alves de Melo
O presente trabalho visa apenas externar alguns conceitos para estabelecermos o debate e possibilitar uma atuação uniforme como meio de segurança jurídica e igualdade na área de execução.
De início é preciso destacar que há a alternativa do protesto extrajudicial de qualquer documento de dívida previsto no art. 1º da Lei 9492/97. E documento de dívida pode ser uma sentença, um TAC, ou qualquer documento de dívida, como a CDA( certidão de dívida ativa), mas culturalmente ainda temos priorizado a execução judicial, a qual nem sempre é eficaz.
As instituições privadas como SPC e SERASA também podem adotar esses dados como integrante de seus cadastros e gerar um pagamento mais rápido do débito.
Para se ter uma idéia, a Execução Fiscal tem uma eficácia inferior a 20% do número de ações, enquanto o pagamento de inadimplentes pelos meios extrajudiciais é bem superior a esse quociente, além de ser uma via mais barata.
Contudo, retornando ao tema principal que seria a Execução Judicial é de se ressaltar que o trabalho restringe-se ao interesse da atividade Ministerial.
A rigor, entendo que o Ministério Público não pode usar a via da Execução Fiscal na área cível, pois depende de uma inscrição na dívida ativa (CDA) e esse ato somente poderia ser feito pela Receita e a execução ficaria a cargo da Advocacia Geral do Estado ou da União (ou Procuradoria da Fazenda)
Portanto, restam as vias da execução de título judicial ou extrajudicial.
A Execução de título extrajudicial seria no caso de descumprimento de TAC, o qual não precisa de duas testemunhas para ter seu valor de título executivo reconhecido.
Se for uma multa por descumprimento de TAC teria natureza de aistreintes. Mas se for algum valor não recolhido seria uma execução com base em título extrajudicial comum.
Uma outra via muito comum é a obrigação baseada em título judicial, nesse caso também pode ser uma obrigação de fazer, não fazer ou pagar, ou até mesmo entregar.
Na obrigação de fazer, não fazer ou não entregar acaba incorrendo na possibilidade de astreintes.
No tocante à obrigação de pagar, a via cabível é a execução judicial comum e não a lei de Execução Fiscal.
É perfeitamente cabível a desconsideração da personalidade jurídica mesmo na fase de execução, quando há indícios de fraude.
Em alguns casos haverá necessidade de ajuizar a liquidação previamente para definir valores.
Se for título judicial bastará uma petição nos próprios autos do processo de conhecimento pedindo a citação do requerido em peça muito similar a uma inicial de execução de título extrajudicial.
É possível ainda as seguintes situações:
a) Na área da infância e adolescência:
1. Se a execução for de multa aplicada decorrente de infração administrativa: Em tese a atividade nesse caso é de cunho administrativo emitida pelo Juiz e a execução pode ser embargada como se fosse título extrajudicial, pois o juiz não atuou em jurisdição clássica, tendo um caráter administrativo.
2. Se a execução for de multa de natureza infracional: Em tese, a atividade é de jurisdição e a eventual apresentação de embargos deve ser em desfavor de título judicial.
A prescrição nesse caso é de cinco anos.
3. Na eventual hipótese de ajuizar ação de execução de alimentos como substituto processual em favor de incapaz em situação de risco seguirá o rito especial da lei de alimentos, sendo necessário fazer expressamente o pedido de prisão civil.
b) Na área de direitos coletivos como ação popular, civil pública e improbidade e direitos indisponíveis.
Se a entidade autora da ação não executar o conteúdo da sentença condenatória, o Ministério Público tem o dever de executar, mesmo que seja ação civil pública.
Nesse caso o rito será o previsto para execução de título judicial. E mesmo na ação de improbidade é possível haver parte da sentença que é dependente de execução como os valores da multa civil e do ressarcimento.
Um detalhe interessante é que a prescrição é, em regra, de cinco anos, mas se for ação de natureza de patrimônio público é imprescritível conforme art. 37, §5º, da CF, podendo em tese ter uma execução praticamente eterna no aspecto patrimonial.
É possível haver prescrição intercorrente, se não for ação com objeto de patrimônio público, tanto moral como patrimonial. Mas eventuais parcelamentos do débito suspendem o prazo prescricional, porém convém colocar esse aspecto claramente na suspensão.
Outrossim, nulidade de ato administrativo pode ser alegada a qualquer tempo, mas a anulabilidade não.
c) Na esfera eleitoral:
1)Multas decorrentes de processo judicial têm como base uma decisão judicial e embora a Lei não esclareça a competência, essa é do Ministério Público de forma concorrente com os demais legitimados ativos, considerando o interesse público da questão, devendo ser executada perante o Judiciário Eleitoral.
A atribuição para execução é do Ministério Público, em que pese o TSE entender o contrário. No caso de multa fixada em AIME, por exemplo, é indiscutível a atribuição do Ministério Público, principalmente se foi o autor da ação, pois é uma ação tipicamente de natureza judicial.
2) Multas decorrentes de processo de natureza de jurisdição voluntária ou seja o ato judicial não é tecnicamente uma sentença como no caso de ausência do eleitor às urnas, infração à propaganda eleitoral e outros fatos comuns, a competência para julgamento é do Judiciário Eleitoral, logo também seria atribuição do Ministério Público Eleitoral pois é o órgão oficiante junto ao Judiciário Eleitoral e não a AGU. O débito tem mais natureza eleitoral do que tributária, em face da especialidade. A execução nesse caso baseará em título extrajudicial e com caráter um tanto quanto inquisitório, pois o Judiciário atuou como órgão administrativo e depois irá julgar a regularidade de seu próprio ato. No mais, aplica-se o mesmo comentário sobre a legitimidade ativa e competência do item 3.a).
d) Na esfera criminal:
1) O Ministério Público deve executar a prestação pecuniária não convertida em prisão, em como pena de multa, mas podendo a prestação pecuniária ser recolhida a entidade privada, característica que também a difere da multa penal. O valor mínimo da multa é 1/3 do salário mínimo, enquanto o da prestação pecuniária é um salário mínimo.
2) A Execução da Pena Pecuniária de natureza criminal é atribuição do Ministério Público como titular da ação penal, afinal sendo a execução consectário lógico e conseqüente da condenação devendo tramitar na Vara Criminal ou de Execução Penal. Ainda por analogia com a modificação no processo civil quando o título é judicial, não são mais duas fases, conhecimento e execução, mas uma fase única. Logo, a titularidade é única também.
3) Nesse caso, a multa penal por disposição expressa da lei seguirá o rito da Lei de Execução Fiscal, o que é uma impropriedade jurídica, pois não é dívida tributária. Contudo, não há necessidade de lançar o débito em dívida ativa. Parece que são modificações mais para atender determinados segmentos jurídicos e que visam apenas criar complicações processuais.
4) Outrossim, como a Fazenda Pública não executa débitos inferiores a R$ 1.000,00, logo estaria havendo um perdão tácito de pena criminal, o que é vedado. Sendo mais um argumento para combater esse estranho argumento de que a Fazenda Pública tem legitimidade para executar multa penal mesmo sendo decorrente de uma titularidade ministerial com previsão constitucional. Seria o mesmo que ter o direito, mas não poder cobrá-lo.
e) Multa decorrente do poder de polícia ministerial:
Caso a multa tenha decorrido do poder de polícia, como no caso do Procon do Ministério Público de Minas Gerais, a execução seguirá o rito para título extrajudicial, pois o poder de polícia é inerente a todas as funções estatais de fiscalização.
f) Direito ambiental e do consumidor
No caso de ação coletiva na defesa do consumidor ou do meio ambiente os valores obtidos deverão ser depositados em fundos indicados na inicial conforme legislação municipal, estadual ou federal, considerando o impacto do dano. É conveniente pedir a intimação da fazenda pública ou órgão gestor do fundo indicado para manifestar interesse no feito.
Os valores decorrentes de dano ambiental ou ao consumidor prescrevem, mas enquanto persistir o dano não há prescrição na prática, pois nesse caso a obrigação de reparar permanece, pois não é a partir do fato, mas sim ao final do dano que inicia a prescrição.
Considerações Gerais. :
A lei 11.232/05 alterou profundamente a execução de título judicial, mas nem toda decisão do juiz é decisão judicial conforme já externado. A lei citada entra em vigor no dia 22/06/06 e de forma resumida dispensou a citação, sendo a execução de título genuinamente judicial mera continuidade do processo de conhecimento, inclusive a liquidação, bastando a intimação na pessoa do advogado. Sendo que o executado intimado para pagar em 15 dias, se não o fizer, paga multa de 15% e os alimentos podem ser fixados com base no salário mínimo. E trocou a palavra “julgamento de mérito” por “resolução de mérito”, mero ataque de tecnicismo de algum departamento técnico.
Pelo Direito Internacional a pessoa tem o direito de optar se dirige diretamente ao Judiciário ou representada por advogado, direito de autodefesa judicial. Mas no Brasil, apesar de previsão constitucional de legitimidade alegam jus postulandi previsto no CPC, ou seja, a lei prevalece sobre a Constituição, afinal “administração da justiça” não significa “postulação em juízo”.
O STJ editou uma súmula de número 314, sobre prescrição intercorrente, mas curiosamente a retirou. Apesar de haver muitas súmulas questionáveis, apenas essa foi retirada. Destaca-se que a Súmula do STJ e demais Tribunais Superiores não é ato jurisdicional, mas apenas administrativo cabendo em tese, mandado de Segurança, mas não há recurso contra a mesma, nem mesmo ADIn, provocando uma lacuna na correção, sendo uma possibilidade a representação junto ao Conselho Nacional de Justiça se a Súmula for abusiva ou ilegal. Também é possível pedir Revisão de Súmula, mas é um procedimento de pouca eficácia prática, pois o Regimento Interno do STJ de forma autoritária não prevê expressamente o pedido de Revisão de Súmula por quem não seja Ministro do STJ.
Conclusão:
A Execução judicial precisa ser revista para simplificar o acesso ao direito, mas sem deixar de se atentar para meios alternativos de resolução de conflitos, sendo de todo necessário reavaliar a necessidade de leilão em praticamente todas as execuções, pois o próprio credor poderia optar em ficar com o bem penhorado.
Outrossim, o Ministério Público precisa debater com maior ênfase sobre esse tema, inclusive do ponto legislativo, bem como sobre experiências práticas.
* André Luis Alves de Melo
Promotor de Justiça em Estrela do Sul - MG