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Livramento Condicional em Crimes Hediondos e Assemelhados após a Declaração de Inconstitucionalidade em Regime Integral Fechado (§ 1º do art. 2º da Lei 8.072/90)

Por: Renato Marcão

Mesmo diante da decisão proferida no Plenário do Supremo Tribunal Federal no dia 23 de fevereiro de 2006, quando se declarou a inconstitucionalidade do regime integral fechado previsto no § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 e se passou a permitir progressão de regime no cumprimento de pena decorrente da prática de crime hediondo ou assemelhado, o inc. V do art. 83 do Código Penal não sofreu modificação. O requisito objetivo para o livramento condicional em se tratando de condenação pela prática de crime hediondo ou assemelhado (mais de dois terços da pena) está mantido. Também continua vedado o livramento em caso de reincidência específica “em crimes dessa natureza”.

Não há inconstitucionalidade no dispositivo legal que estabelece prazo maior de cumprimento de pena para obtenção do livramento, tampouco quando impõe vedação.
Permitida a progressão e por meio dela, o executado sairá do regime fechado para o semi-aberto, e deste para o aberto, por etapas, de forma escalonada, quando satisfeitos os requisitos. Estando a cumprir pena no regime aberto, em casa de albergado ou estabelecimento adequado, poderá beneficiar-se com livramento condicional após o cumprimento de mais de 2/3 (dois terços) da pena aplicada, salvo na hipótese em que vedado o benefício (reincidência específica...).

Na prática, entretanto, a situação será diversa, visto que na grande maioria das comarcas não há casa de albergado e, diante da ausência de qualquer estabelecimento adequado, a solução excepcional tem sido conceder, contra legem, albergue domiciliar (art. 117 da LEP). 

Obviamente, estando em albergue domiciliar o executado não irá postular livramento condicional, pois o cumprimento de pena na forma domiciliar é mais vantajoso.

Para melhor compreensão, analisemos a seguinte hipótese: condenado ao cumprimento de 3 (três) anos de reclusão pela prática do crime de tráfico ilícito de entorpecente, após cumprir 1/6 (um sexto) da pena (requisito objetivo) e contando com atestado de boa conduta carcerária firmado pelo diretor do estabelecimento (requisito subjetivo), o executado deverá receber progressão para o regime semi-aberto. Após cumprir mais 1/6 (um sexto) da pena e comprovar bom comportamento no regime intermediário receberá nova progressão, agora para o regime aberto.

Havendo casa de albergado ou estabelecimento adequado, o executado será efetivamente submetido ao regime aberto, onde, depois de cumprir mais de 2/3 (dois terços) da pena aplicada, se presentes os demais requisitos, estará em condições de obter livramento condicional. Note-se que ao ingressar no regime aberto o executado já cumpriu no mínimo 1/3 (um terço) da pena aplicada (1/6 no fechado e 1/6 no semi-aberto), restando a cumprir, no aberto, apenas 1/3 (um terço) para que se tenha por satisfeito o requisito objetivo (1/3 + 1/3 = 2/3).

Na prática, entretanto, estando de direito no regime aberto (após progressão), e não havendo casa de albergado ou estabelecimento adequado onde possa cumprir pena, ao executado será concedido, excepcionalmente, albergue domiciliar (art. 117 da LEP). O livramento condicional será possível nas mesmas condições acima anotadas, entretanto, por certo não haverá quem se atreva a tal postulação, visto que o cumprimento de pena em albergue domiciliar atende melhor aos interesses do executado.

É preciso que o legislador se apresse, sem descuidar de redobrada cautela, em dar novo tratamento normativo à progressão de regime e ao livramento condicional, notadamente em se tratando de condenação decorrente da prática de crime hediondo ou assemelhado.


* Renato Marcão 

Membro do Ministério Público do Estado de São Paulo
Mestre em Direito Penal, Político e Econômico
Professor de Direito Penal, Processo e Execução Penal
Presidente da AREJ – Academia Rio-pretense de Estudos Jurídicos
Membro da Association Internationale de Droit Pénal (AIDP),
do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim),
do Instituto de Ciências Penais (ICP),
do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP) e
do Instituto de Estudos de Direito Penal e Processual Penal (IEDPP)


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