* Artigo escrito por José Carlos M. Nery Junior, presidente da Associação Goiana do Ministério Público (AGMP), originalmente publicada em 24 de junho pelo portal O Popular
Causa preocupação o significativo aumento de procedimentos disciplinares instaurados no Conselho Nacional do Ministério Público com o escopo de apurar “excessos de linguagem” em manifestações públicas de promotores e procuradores de Justiça.
Reportagens veiculadas na internet dão conta que de janeiro a maio de 2018 o número de reclamações dessa natureza foi 66% maior do que todo o volume registrado durante o ano de 2017.
No mais recente caso, a Corregedoria Nacional do Ministério Público instaurou reclamação disciplinar para investigar a conduta do combativo Promotor de Justiça Fernando Krebs, membro do Ministério Público de Goiás, em razão das críticas por ele proferidas, durante uma entrevista, ao analisar as públicas decisões da lavra do Exmo. Senhor Gilmar Mendes, Ministro do Supremo Tribunal Federal.
A Constituição Federal assegura a todo cidadão o direito de liberdade de expressão e de manifestação de pensamento, seja ele servidor público ou não. No caso específico dos membros do Ministério Público, a Lei Orgânica Nacional ainda prevê que promotores e procuradores gozam de inviolabilidade pelas opiniões que externam ou pelo teor de suas manifestações processuais.
Por outro lado, milhares de brasileiros, das mais diversas profissões, em sintonia com o espírito democrático que deve nortear o país, também têm, diariamente, externado publicamente - em entrevistas, redes sociais, artigos, etc. – veementes críticas às decisões prolatadas pela referida autoridade.
O que justificaria, a título de exemplo, punir administrativamente um membro do Ministério Público pelas críticas proferidas e não punir o Exmo. Ministro pelas contumazes palavras ofensivas dirigidas, em sessões públicas do STF, a seus pares e membros do Ministério Público?
A supressão da liberdade de expressão dentre outras liberdades individuais, remonta à época da ditadura e resgata um patamar de censura incompatível com o atual Estado Democrático de Direito, conquista histórica do povo brasileiro.
É preciso tomar cuidado para que o conceito indeterminado de “excessos de linguagem” não dê margem a uma seletividade de ações e punições correicionais e acabe se transformando em uma verdadeira “mordaça”. Como disse Evelyn Beatrice Hall, autora da biografia de Voltaire: “Eu posso discordar da sua opinião, mas lutarei até a morte pelo seu direito de dizê-la”.