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Deveres e desafios do Ministério Público em defesa da democracia

Artigo originalmente publicado no jornal O Estado S. Paulo no dia 26 de setembro de 2018

 

O conturbado e imprevisível cenário político-institucional brasileiro, com os temperos próprios do atual processo eleitoral, é pródigo em produzir paradoxos e revelar perplexidades.

Ao mesmo tempo em que a sociedade deposita fundadas expectativas na atuação do Ministério Público e no exercício da democracia – conquistas memoráveis de nossa cidadania -, incontáveis são as vezes em que a instituição ministerial é confrontada em relação à regularidade de sua atuação.

As ações do Ministério Público em defesa do interesse público e dos princípios democráticos, no âmbito cível, criminal e eleitoral, sempre têm como parâmetro a ordem jurídica e buscam, em última análise, fazer preponderar a igualdade e a justiça como valores supremos da sociedade, exatamente como proclamado no preâmbulo de nossa lei fundamental.

Ao determinar que o Ministério Público defenda os interesses sociais indisponíveis, a ordem jurídica e democrática; que protagonize a apuração da responsabilidade civil e criminal dos autores de fatos típicos e ilícitos, a Constituição Federal de 1988 nada mais faz do que ordenar aos agentes do Ministério Público que, ao fim e ao cabo, velem pela preponderância dos mais elevados valores éticos e cívicos, sem os quais não se constrói uma grande nação.

Por isso, e para que o Ministério Público possa exercer, na plenitude, sua missão constitucional, nós, que integramos e presentamos a Instituição, protestamos quando desdenham dos princípios da independência e da autonomia institucional. Repudiamos qualquer tentativa de regular, externa e abusivamente, ou interna e veladamente, a atuação finalística dos agentes da Instituição. Como guardiões da democracia, com clareza também nos posicionamos quando prerrogativas funcionais postas à disposição da sociedade são alvo de ataques; ou mesmo quando, sob os mais diversos argumentos, são fragilizados os instrumentos indispensáveis para a atuação fiscalizatória e de controle do parquet.

A recente iniciativa do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) de verificar, pela via dos procedimentos disciplinares, a regularidade da atuação ministerial, pelo simples fato de as ações terem sido impulsionadas no período eleitoral (como se o calendário eleitoral pairasse absoluto sobre todas as formas de vida, inclusive as que ocorrem no terreno das ilegalidades e ilicitudes), é mais um exemplo preocupante. Aliás, tal providência, mutatis mutandis, trilha o mesmo caminho das tentativas congressuais de aprovar uma nova lei de abuso de autoridade, conforme já denunciado em inúmeras manifestações, inclusive em audiências públicas realizadas no âmbito das casas legislativas.

Também, só para exemplificar, neste ano, no âmbito da Justiça Eleitoral, como resultado de um alardeado rezoneamento realizado em nome da economia de insignificante parcela do orçamento, foram extintas aproximadamente 400 Zonas Eleitorais no País. Nesta eleição, portanto, teremos 400 promotores (e 400 juízes) a menos fiscalizando a propaganda, os possíveis crimes eleitorais, fraudes, abusos de poder político e econômico, e enfrentando outros tantos desafios contemporâneos, de diferentes nuances e impactos, como o combate às fake news, cujo tema ganhou visibilidade entre os usuários de redes sociais. Considerando o atual cenário eleitoral, bastante polarizado, a influência de falsas notícias em processos eleitorais – o que já ocorreu recentemente em países como os Estados Unidos e a França – é um perigo iminente para o eleitorado brasileiro.

Defender a lisura dos pleitos eleitorais e a livre manifestação do eleitorado, assim como defender as prerrogativas que permitem a atuação independente do Ministério Público, sempre na defesa dos valores permanentes da nação, da ordem jurídica, da probidade administrativa e da paz social, concretiza momento especial da vida nacional e indicativo seguro de melhores destinos para o País.

Nesse contexto, a nós, membros do MP – atuantes de Norte a Sul do País – cumpre buscar a excelência no exercício das funções que nos foram delegadas pelo legislador constituinte e, para isso, por certo, não pouparemos esforços. Podem todos ter certeza, mais uma vez, o Ministério Público brasileiro não faltará ao Brasil!

 

*Victor Hugo Azevedo é presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP). Promotor de Justiça, formado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de Santo Ângelo, no Rio Grande do Sul.



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