Os desafios inerentes à atuação dos membros do Ministério Público no desempenho de suas atribuições vão muito além da conceituação vigente que considera a atividade apenas como administrativa e judicial. Os Procuradores e Promotores de Justiça, em conjunto com instituições do sistema da Justiça e segurança pública, como as Polícias Federal, Civil e Militar, agem diretamente no combate à criminalidade grave. Com isso, os membros do Ministério Público correm, de fato, risco pessoal e familiar no cumprimento de suas funções, não sendo raro nos depararmos com situações de ameaças e, até mesmo, quadros gravíssimos de assassinatos.
Diante dessa realidade, a CONAMP (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público), entidade que representa mais de 16 mil Membros do Ministério Público em todo o Brasil, apresentou à PGR (Procuradoria-Geral da República), no início de setembro, a minuta de um projeto de lei em reconhecimento à atividade de risco de Procuradores e Promotores de Justiça.
O principal objetivo da iniciativa é demonstrar que se trata de uma atividade de risco sobre aspecto do combate ao crime organizado, já que os membros do MP convivem com situações diárias que necessitam de retaguarda e de segurança institucional.
Em seu dia a dia, os Procuradores e Promotores de Justiça atuam em oposição ao crime organizado, combate à corrupção e facções criminosas, ou seja, a criminalidade grave em todos os setores. Atualmente, existem vários membros do MP em regime de segurança em razão de ameaças e grave risco de vida.
A atuação do MP ocorre na seara administrativa e extrajudicial e se estende por todas as fases dos processos cíveis ou criminais ajuizados com a finalidade de proteção dos bens jurídicos erigidos a esse patamar pelo texto constitucional ou pelas leis em vigor, conforme vontade popular expressa na manifestação do legislador. Ou seja, ao MP cabe zelar pelo interesse público.
No encaminhamento da sustentação das acusações, o membro do MP participa de audiências com presença de acusados e, nos crimes dolosos contra a vida, ele comparece as sessões dos Tribunais do Júri, onde na presença de todos os participantes expõem oralmente os fatos e elementos do processo e, ao final, requer a condenação dos envolvidos.
O MP também é responsável por pleitear em juízo, através de ação penal correspondente, a pretensão punitiva estatal, civil, penal e administrativa. São atribuições da carreira que tornam indispensável reconhecer que a atuação ministerial possui maior abrangência e risco a seus agentes.
Hoje, a categoria não goza desse reconhecimento legal, que na visão da CONAMP é legítimo. A proposta foi elaborada pela Comissão de Proposição Legislativa da entidade e ratificado pelo conselho deliberativo. Trata-se de uma conceituação que afaste a atuação do MP de ser uma atividade apenas administrativa e judicial.
É importante deixar claro e transparente que o reconhecimento é exclusivamente conceitual. Com o projeto, não há repercussão financeira, pecuniária, previdenciária ou de qualquer espécie à carreira. O reconhecimento como atividade de risco muda a visão da própria instituição sobre a atuação dos membros do MP. Como resultado, a medida pode representar a implementação de planejamentos mais robustos de segurança para os membros do MP desempenharem suas funções.
Diante do cenário exposto, é pertinente que o texto seja enviado como projeto de lei ao Congresso Nacional. A tramitação e aprovação pela Casa Legislativa de projeto com esse pleito faz-se necessária para ressaltar a importância da atuação do MP na sociedade brasileira neste período tão desafiador, em que vemos a escalada dos índices de violência e criminalidade nas mais diversas esferas.
A medida pode contribuir tanto para a atuação do MP quanto para o fortalecimento da democracia brasileira e do Estado Democrático de Direito. O reconhecimento legislativo da atuação dos membros como atividade de risco é fundamental para garantir e dar mais segurança à atuação estratégica dos Procuradores e Promotores de Justiça do Ministério Público brasileiro no combate à corrupção e criminalidade grave, questões urgentes e de interesse de toda a sociedade.
*Manoel Murrieta é promotor de Justiça do Estado do Pará, professor de Direito Processual Penal e presidente da CONAMP
Artigo originalmente publicado no Estadão no dia 25 de setembro de 2020. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/os-riscos-intrinsecos-a-atuacao-do-ministerio-publico-demandam-reconhecimento/