A influência da tecnologia sobre a humanidade é não só intensa como disruptiva. Modos de vida são alterados, facilidades construídas e novas dificuldades enfrentadas, exigindo um contínuo processo de reconstrução. A democracia digital nada mais é que o uso da comunicação e da informação tecnológica, em todas as espécies de mídia, com o objetivo de ampliar a participação política do cidadão. Isto ocorre sem os tradicionais limitadores de tempo e espaço, próprios do ambiente analógico.
A competitividade entre os concorrentes nas eleições pode ser seriamente comprometida a partir de práticas bem comuns. É o que se dá com a disseminação de notícias falsas e a utilização de robôs para sedimentar conteúdos no imaginário coletivo. Afinal, como se costuma dizer, uma mentira repetida mil vezes acaba virando verdade. Esse quadro torna-se particularmente dramático nas sociedades em que a média da população tem baixo nível de escolaridade. Dados do IBGE, de 2019, informam que cerca de 41,2% da população com 25 anos ou mais tem no máximo o ensino fundamental, completo (8,1%) ou incompleto (33,1%), além de 6,9% sequer contarem com instrução formal. Isso certamente explica a reduzida capacidade crítica de considerável parcela da população, que não consegue perceber a deturpação da informação, por mais tosca que seja.
Em 2020 teremos eleições municipais, de vital importância para a formação da base política dos partidos e com grande influência na definição da estratégia a ser adotada nas próximas eleições gerais. Estamos no meio de uma revolução tecnológica e, embora saibamos que ela há muito se iniciou, estamos longe de saber quando terminará. A disruptura, portanto, é contínua. Basta pensarmos na última eleição presidencial, quando o candidato eleito teve apenas oito segundos de tempo de TV, até aquele momento considerado a pedra angular de uma campanha eleitoral. Desde então, a força da web só aumentou.
Os principais padrões de comunicação e de informação utilizados com o uso da tecnologia são a alocução (transmissão da informação), a consulta (recuperação da informação) e a conversação (troca de experiências). Temos, aqui, o ciclo completo do processo político: o candidato se apresenta, o eleitor em potencial pesquisa sobre ele e discute suas ideais com outros eleitores. Apenas o voto escapa desse ciclo. Em todas as fases, fake news e robôs produzem efeitos deletérios. Além disso, o ambiente virtual é dominado por algoritmos que apresentam pouca ou nenhuma transparência, produzindo o efeito perverso de direcionar pensamentos, emoções e, porque não, votos.
A democracia digital, por certo, tem os seus encantos, mas também oferece riscos.
Artigo publicado no dia 5 de novembro na revista Justiça e Cidadania. Disponível em: https://www.editorajc.com.br/democracia-digital-e-eleicoes-2020/