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Os riscos da superposição de atribuições na Defensoria Pública

Artigo originalmente publicado pela revista Justiça&Cidadania, disponível em: https://www.editorajc.com.br/os-riscos-da-superposicao-de-atribuicoes-na-defensoria-publica/

*Por Manoel Murrieta, presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - CONAMP

O Congresso Nacional se depara, neste momento, com um tema sobre o qual os membros do Ministério Público dedicam especial atenção. Trata-se da tramitação de um conjunto de projetos de lei que abordam a atuação da Defensoria Pública, uma inestimável carreira cujas funções, definidas desde a sua criação, foram estabelecidas para garantir a defesa dos cidadãos que não têm condições de custear os trabalhos de advogados particulares, permitindo, assim, que sua representação perante a Justiça não seja prejudicada.

No entanto, algumas das propostas hoje em trâmite, casual ou fortuitamente, preveem mudanças que, uma vez aprovadas pelo Congresso Nacional, causarão uma série de superposições com funções já estabelecidas pelo Ministério Público e seus membros.

Um exemplo é o Projeto de Lei 4431/2021, que busca alterar o Estatuto do Idoso e da Pessoa com Deficiência. Aprovado no Senado e posteriormente submetido à Câmara dos Deputados, o projeto recebeu diversas emendas e um substitutivo que passou a dar aos defensores públicos o poder de fiscalização, investigação e busca de responsabilização de entidades governamentais e não governamentais que atendem idosos e pessoas com deficiência. Tais atribuições não fazem parte do escopo da carreira dos defensores públicos, mas sim dos membros do Ministério Público.

A proposta não apenas fere o perfil constitucional da Defensoria Pública, como também contraria o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a necessidade de pertinência temática nas ações coletivas da Defensoria. Além disso, de maneira prática, o implemento de atribuições à carreira dos defensores públicos enfrentaria um entrave prático, que é a falta de membros capazes de exercer tais funções, uma vez que a realidade atual já se mostra deficitária frente às necessidades da população para o exercício de suas funções regulares.

Atualmente, a Defensoria Pública está presente em apenas 42% das comarcas do país, o que significa que cerca de 80% dos municípios brasileiros não têm acesso aos seus serviços. Trata-se, portanto, no caso de aprovação de tal alteração legislativa, do estabelecimento de novas atribuições para uma carreira que passará a replicar, em grande parte, as atribuições do Ministério Público – sem solucionar os problemas preexistentes de falta de acesso à assistência jurídica.

Já vivenciamos casos de sobreposição de funções, visto que a Defensoria Pública já se envolveu em casos de assistência de acusação, uma função que já é desempenhada pelo próprio Ministério Público.

A posição da Conamp não pretende ser contrária ao avanço da Defensoria Pública e de seus membros, mas cabe à entidade fazer o alerta para os riscos que tais mudanças – cujo amplo debate muitas vezes fica prejudicado frente ao grande volume e diversidade de temas sobre os quais se debruçam os parlamentares – podem gerar nas demais carreiras.

É fundamental que as eventuais mudanças advindas das propostas em debate resguardem o perfil constitucional de cada instituição e evitem a superposição de funções. Desta forma, Defensoria Pública e Ministério Público poderão cumprir cada um com a sua missão constitucional antes de buscar uma expansão desproporcional de suas atribuições, o que pode acarretar uma atuação menos eficaz e eficiente em benefício da sociedade.

Os debates em torno dos projetos de lei propostos pela Defensoria Pública refletem um importante diálogo sobre o papel de instituições fundamentais para a justiça e a defesa dos direitos dos cidadãos no Brasil. A preocupação da Conamp com a superposição de funções é um alerta para a necessidade de se equilibrar as atribuições das instituições envolvidas, respeitando a conformação constitucional de cada uma.

O caminho para a justiça e a equidade passa pela otimização de recursos públicos e pela atenção às necessidades reais da população, sem comprometer o funcionamento adequado das instituições. Portanto, é vital que o Congresso Nacional avalie cuidadosamente esses projetos de lei e busque soluções que promovam o bem-estar da sociedade brasileira.



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