Autores: Octavio Paulo Neto (MPPB), Paulo Rubens Carvalho Marques (MPSC), Guilherme André Pacheco Zattar (MPF), Alberto Vinícius Cartaxo da Cunha (MPPB)
O Conselho Nacional do Ministério Público, pela Estratégia Nacional do MP Digital da Comissão de Planejamento Estratégico, promove nesta semana (de 19 a 21 de junho) o 2º Congresso de Inovação e Tecnologia do Ministério Público. No evento, um tema ganhou destaque pela presença massiva nas palestras, oficinas e demonstrações de projetos e aplicações do MP brasileiro: a inteligência artificial generativa.
A inteligência artificial (IA) generativa é a grande área de destaque no cenário tecnológico do momento, com potencial para transformar o funcionamento de várias instituições, entre elas o Ministério Público (MP). Ela se tornou tão presente em nossa realidade que desafia tudo o que conhecemos, e alguns até afirmam que ela desafia o que somos. Afinal, somos humanos por sermos inteligentes ou somos inteligentes por sermos humanos? Como a IA detém todo o conhecimento e, de certa forma, os meios para expressá-lo, surge a grande questão que se coloca, a difusão das tecnologias irá reformular a visão de nós mesmos? Não pretendemos resolver esta questão neste artigo, mas apenas refletir que não podemos nos abster do seu uso e entendimento.
Esta tecnologia, que cria conteúdo textual, visual e auditivo automaticamente, não só muda vários setores, mas também aumenta o poder cognitivo dos usuários, dando mais tempo para pensar e planejar cenários. Ela ajuda os usuários a focar na solução de problemas com perguntas mais precisas, já que só restam dúvidas. Ao usar essa tecnologia, essas dúvidas viram bases para análises mais profundas, melhorando as operações, as decisões e a inovação no MP, organizando e mostrando conhecimentos espalhados. Mas, para aceitar essa inovação, é preciso coragem para lidar com o novo, uma mentalidade de aprendizado constante e, principalmente, adaptabilidade.
Em um contexto marcado pela ascensão da IA, a capacidade de manejar o desconhecido, mesmo que de forma imperfeita, é crucial e essencial para a sobrevivência em tempos desafiadores, tempos líquidos. A introdução de novas tecnologias sempre carrega riscos e incertezas. Por isso, é vital que o MP compreenda que os erros são parte integrante do processo inovador e que cada contratempo é uma oportunidade de aprendizado e evolução dentro de um ambiente controlado e seguro. É preciso errar rápido e pouco, pois são escassos os recursos, e vivemos sob o signo da urgência. As experimentações iniciais devem ocorrer sob condições controladas, mas é imprescindível que os membros da instituição se lancem ao desafio de tornar a prestação de serviços mais ágil e precisa, especialmente em um mundo pós-normal, onde a incerteza impera. O período inicial de experimentação com a IA generativa permite ao MP explorar diversas aplicações e identificar aquelas que trazem os melhores resultados.
Em levantamento recente, o CNMP apurou que mais da metade das unidades já possui iniciativas com o uso de Inteligência Artificial, tendo dois grandes destaques no uso da IA Generativa: o FRATRIA (do MPBA) e o LuminarIA (do MPDFT), ambos capazes de conduzir casos desde a sua triagem até a proposição de peças para encaminhamentos decididos pelos membros do Ministério Público. Mas os exemplos vão além: a análise de documentos legais usando modelos de linguagem pode ajudar a melhorar a redação jurídica, realizar pesquisas mais eficientes, resumir informações de várias fontes e extrair tendências e insights. Isso inclui o estudo de grandes volumes de dados, a criação de sinopses, resumos e fichas técnicas, e a gestão do conhecimento para facilitar a recuperação de informações e a geração de novos insights a partir de bancos de dados. Esses processos podem e devem começar com projetos-piloto, que serão gradualmente expandidos com base no feedback recebido. Dessa forma, contribuem para o refinamento tecnológico e a adaptação dos processos internos, maximizando o conhecimento institucional e aliviando a carga de trabalho dos membros da instituição.
O MP precisa ser resiliente e adaptável para prosperar em um ambiente tecnológico que muda rapidamente, aceitando as imperfeições iniciais. Isso envolve criar uma cultura organizacional que incentive a inovação e as novas abordagens sem medo de falhar, mas com cuidado para evitar desperdícios. A IA generativa tem benefícios claros, mas também implica em questões éticas e desafios técnicos que requerem uma análise cuidadosa. Os modelos de IA usados devem ser transparentes e compreensíveis. As decisões apoiadas por essas tecnologias devem ser justificáveis, especialmente em um contexto jurídico onde a transparência é essencial para a justiça, e as decisões tomadas devem ser sempre relegada aos humanos, tendo a IA como ferramenta de apoio somente. A revisão humana obrigaória aumenta a confiança e garante que as decisões sejam sustentáveis em qualquer ambiente.
Para a efetivação da IA generativa no Ministério Público, é crucial seguir estratégias principais como o investimento na qualificação dos profissionais, a alfabetização de dados, a realização de workshops sobre ética em IA e a incentivo de parcerias com entidades acadêmicas e tecnológicas. Além disso, a execução de projetos-piloto e a construção de protótipos são etapas essenciais para experimentar e melhorar as soluções de IA em escala pequena, preparando o campo para uma expansão mais abrangente e segura. Criar um ciclo constante de feedback e melhoria é importante, bem como desenvolver uma governança forte para a IA, garantindo a aderência à Constituição Federal, aos regulamentos legais e protegendo os direitos dos cidadãos (missão última do MP).
Para agregar maior valor à implementação de projetos de IA, ao nosso ver, qualquer projeto deve focar no impacto no atendimento ao cidadão, diminuindo a distância e acolhendo absolutamente todos, proporcionando respostas mais rápidas e precisas às suas demandas.
A Inclusão Digital e Acessibilidade são indispensáveis, qualquer projeto deve garantir que as soluções de IA sejam acessíveis a todos os cidadãos, incluindo aqueles com necessidades especiais, promovendo a inclusão digital, pois é dever do Ministério Público não esquecer de absolutamente ninguém.
Além disso, a educação e conscientização pública são fundamentais para destacar a necessidade de educar e conscientizar o público sobre o uso da IA, promovendo transparência e confiança, com planos concretos de letramento dentro e fora da instituição.
A Colaboração Interinstitucional deve ser o alicerce, pois a cooperação entre diferentes órgãos públicos e setores resulta em ganhos sinérgicos na implementação eficaz da IA, compartilhando as melhores práticas e recursos, ninguém faz nada sozinho.
Demais disso, é crucial medir os Custos e o Retorno sobre Investimento (ROI), o ambiente público exige economicidade e eficiência, portanto, é imprescindível abordar os aspectos financeiros da implementação de IA, incluindo custos iniciais, manutenção e o potencial retorno sobre investimento a longo prazo, com métricas realísticas.
Os projetos devem também visar a adaptabilidade a mudanças regulatórias, discutindo como a IA pode ajudar o Ministério Público a se adaptar rapidamente a alterações regulatórias e legais, mantendo a conformidade e a eficiência.
A Gestão de Mudança Organizacional deve ser enfatizada, destacando a importância de estratégias eficazes para facilitar a transição para o uso de IA, engajando os servidores e membros e mantendo uma comunicação clara.
Finalmente, é essencial implementar sistemas de monitoramento e avaliação contínuos para medir o desempenho das soluções de IA e realizar ajustes conforme necessário, maximizando a eficácia.
Portanto, o MP pode aproveitar melhor a IA generativa se for proativo em relação às novas tecnologias e se aceitar os erros iniciais, superando os desafios éticos e técnicos e mantendo seu papel essencial na justiça e nos direitos dos cidadãos. A inteligência artificial generativa é mais do que uma ferramenta tecnológica, é um pilar estratégico para que o Ministério Público possa dar o exemplo, mostrando como as instituições podem se adaptar e prosperar na era digital, mantendo sua relevância social e garantindo que a justiça seja mais eficaz e equitativa.
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