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Direito Judicial e Teoria da Constituição

O redimensionamento do papel desempenhado pelas distintas funções estatais, em especial pelo Poder Judiciário, fenômeno correlato às próprias mutações do Estado de Direito, terminou por aproximar os momentos de criação e de aplicação da norma. A importante atividade desenvolvida pelos órgãos jurisdicionais no processo de integração das normas, o controle de constitucionalidade, a posição do Judiciário perante as omissões legislativas e a força normativa dos precedentes exigem esforços no sentido de sistematizar o denominado Direito Judicial, delineando as potencialidades e os respectivos limites. Com isso, será possível assegurar a permanência dos alicerces do ideal democrático sem ignorar o modo como a norma efetivamente se projeta na realidade.

Sumário: 1. Aspectos Introdutórios. 2. Individualidade Existencial do Direito Judicial. 3. Direito Judicial e Legitimidade do Poder Judiciário. 4. A Dicotomia Norma Geral – Norma Individual. 5. O Direito Judicial e a Preservação da Constituição. 6. As Omissões Legislativas e o Direito Judicial. 7. O Direito Judicial e a Densificação das Normas Constitucionais de Estrutura Aberta. 8. A Força Normativa dos Precedentes e a Generalização das Individualidades. Epílogo. Referências Bibliográficas.

 

1. Aspectos Introdutórios. Acompanhando a linha evolutiva do Estado de Direito, a noção de função jurisdicional tem igualmente passado por inúmeras vicissitudes. Sob uma perspectiva orgânica, o seu aparecimento certamente está associado à edição, na Grã-Bretanha, do Act of Settlement, de 1701, que garantiu a independência e a correlata autonomia existencial dos órgãos jurisdicionais, colocando-os acima da vontade livre da Coroa.[1]

Não é por outra razão que Locke, poucos anos antes, ao desenvolver o alicerce teórico da Glorious Revolution de 1689, concebeu o poder de julgar sob uma ótica eminentemente funcional, concentrando no órgão representativo do Estado (v.g.: o rei) o exercício das funções administrativa e judicial: reconhecia-se a divisão funcional do poder, não a orgânica.[2] Já Montesquieu, escrevendo em momento posterior ao Act of Settlement e utilizando as instituições inglesas como referencial, aperfeiçoou a construção de Locke e traçou as linhas estruturais da clássica tripartição do poder, consagrando-a também sob o prisma orgânico.[3]

Montesquieu, no entanto, atribuiu ao Judiciário um papel invisível e neutro - que bem se refletia na célebre frase de que o “juiz não é senão a boca que pronuncia as palavras da lei”, “não podendo moderar-lhe a força nem o vigor”. Ante a neutralidade atribuída ao juiz, era inconcebível o exercício de atividade outra que não a de mera subsunção, o que afastava a realização de qualquer operação valorativa que terminasse por adequar a norma aos influxos sociais. O juiz deveria seguir a “letra da lei” e os entendimentos do juiz deveriam ser fixos, de modo que nunca fossem mais do que um texto preciso da lei, concepção que se mostrava necessária por ser o Poder Judiciário “um poder terrível entre os homens”. Somente o Legislativo, especificamente o Corpo dos Nobres, poderia valer-se da eqüidade ao apreciar as matérias jurisdicionais que lhe eram atribuídas (v.g.: julgar os aristocratas e as demais figuras preeminentes), o que decorreria de sua participação na produção normativa, tendo autoridade para “moderar a lei em favor da lei, pronunciando-se menos rigorosamente que ela”. Esse dualismo de jurisdição caracterizava o sistema constitucional inglês à época, sendo justificável por ser “necessário que os juízes sejam da condição social do acusado ou seus pares”.  

A exemplo de Locke, também Montesquieu concebera a teoria da separação dos poderes como uma forma de preservação da liberdade contra o arbítrio. Ambos, no entanto, além de prestigiarem a dicotomia entre o Legislativo e o Executivo, dispensavam uma importância secundária ao Judiciário: Locke sequer concebeu um poder autônomo, integrando a função de julgar num universo mais amplo, o de executar a lei; Montesquieu, apesar de prestigiar a existência de um poder autônomo encarregado da função jurisdicional, apressava-se em realçar a necessidade de o Judiciário manter-se adstrito à “letra da lei”.

Essa breve notícia histórica permite visualizar, com relativa clareza, as profundas mutações de natureza inter e intra-orgânica que se operaram nas estruturas políticas de poder, em especial na função jurisdicional.

A aferição da compatibilidade da produção normativa com o texto constitucional, nos sistemas que atribuem esse papel ao Judiciário, indica uma indiscutível influência no delineamento do padrão de conduta a ser seguido pela coletividade, o que levou Kelsen a visualizar sua atuação como verdadeiro “legislador negativo”.[4] De igual relevância é a posição dos tribunais em face da omissão legislativa na integração de eficácia das normas constitucionais.

A própria produção normativa, numa fase pós-positivista, sofreu um profundo realinhamento com o reconhecimento do caráter normativo dos princípios jurídicos, redundando no enfraquecimento da senhoria normativa do Poder Legislativo e na correlata pulverização dessa função entre os demais, cabendo ao Judiciário a atividade valorativa final conducente à densificação dessa espécie normativa.

Cabendo aos órgãos jurisdicionais velar pela preeminência da norma de direito, sua intervenção final, observada a sistemática legal, será definitiva (final enforcing power). Essa constatação, embora não suscite maiores dúvidas quando direcionada ao caso concreto sub judice, exige sejam identificados os efeitos que as decisões dos tribunais superiores irradiarão sobre os inferiores, condicionando e direcionando a sua atuação. Admitido o efeito vinculante dos precedentes, característica inerente aos sistemas de common law, será inevitável o reconhecimento de que os tribunais dispõem de um certo poder normativo, digamos indireto, pois, apesar de os referidos precedentes não serem direcionados à vida de relação, terminarão por regulá-la quando apreciada em juízo. Todos os sistemas constitucionais contemplam a existência de normas oriundas do Legislativo, do costume e da jurisprudência, repousando o diferencial no elemento predominante e no modo como se articula com os demais.[5]

O Direito Judicial reflete a atividade de definição do Direito (juris dictio) pelos tribunais, podendo assumir perspectivas concretas (v.g.: na solução de litígios específicos) ou abstratas (v.g.: no controle de constitucionalidade das leis realizado pelos Tribunais Constitucionais). No primeiro caso, assumindo uma postura retrospectiva, voltada ao passado; no segundo, com uma postura prospectiva, direcionada ao futuro, à regulação de relações jurídicas vindouras. Além disso, quando em cotejo com a produção normativa de cunho legislado, pode mostrar-se corretor da lei, concorrente da lei, substitutivo da lei e supressivo da lei.

Não é demais lembrar que esse profundo redimensionamento metodológico da atividade do Judiciário, da sua inter-relação com os demais poderes e da sua projeção na coletividade não assumiu um colorido uniforme em todos os Estados, sendo plenamente factível a coexistência de esferas de inegável expansão com outras de tradicional retração.[6]

Parece evidente não ser este o locus adequado a uma abordagem exauriente dos múltiplos aspectos mencionados, mas a sua mera indicação mostra-se suficiente ao propósito almejado: realçar a importância do Direito Judicial (Richterrecht) como normativa geral, que transcende o caso concreto.[7]

 

2. Individualidade Existencial do Direito Judicial. O designativo utilizado, como é perceptível, é de todo infeliz, pois o adjetivo qualificador do substantivo direciona-se à origem do Direito, não à matéria por ele versada (v.g.: Direito Constitucional, Direito Administrativo etc.), o que aconselharia falar-se, por identidade de razões, em Direito Legislativo, terminando por inviabilizar toda e qualquer tentativa de sistematização. No entanto, tem o mérito de realçar a preeminência dos órgãos jurisdicionais na argumentação desenvolvida, indicando, de imediato, os objetivos pretendidos.  

A principal singularidade do Direito Judicial em relação à norma geral de origem legislativa é a sua maior maleabilidade, somente persistindo a sua “densidade normativa” enquanto aplicada pelos órgãos jurisdicionais, acrescendo ser plenamente legítimo o avançar ou o retroceder em seu entendimento.[8] O seu iter operativo direciona-se, com maior intensidade, à especificação da norma individual, à delimitação do regramento incidente no caso concreto, o que, como veremos, não obsta à sua generalização, vindo a regular condutas concebidas em abstrato.

O Judiciário, em sua ati­vi­da­de de rea­li­za­ção do Direi­to, a par­tir da valo­ra­ção da situa­ção fáti­ca e do regra­men­to posto pelo Legislativo, será res­pon­sá­vel pela con­fec­ção da regra que rege­rá o caso con­cre­to. Nesse par­ti­cu­lar, é visí­vel o aper­fei­çoa­men­to da dou­tri­na posi­ti­vis­ta clás­si­ca, na qual o coman­do nor­ma­ti­vo era exau­ri­do pelo legis­la­dor, após sope­sar a rea­li­da­de feno­mê­ni­ca, caben­do ao intér­pre­te, uni­ca­men­te, a rea­li­za­ção de uma ope­ra­ção de sub­sun­ção, sendo ínfima a liber­da­de de con­for­ma­ção, ainda que dire­cio­na­da ao caso con­cre­to.[9] Atualmente, raras são as vozes que se insur­gem con­tra a impres­cin­di­bi­li­da­de da ati­vi­da­de do intér­pre­te no papel de agen­te den­si­fi­ca­dor do con­teú­do nor­ma­ti­vo edi­ta­do pelo legis­la­dor, máxi­me com a inten­si­fi­ca­ção do uso de prin­cí­pios jurí­di­cos, cláu­su­las gerais e con­cei­tos jurí­di­cos inde­ter­mi­na­dos, que somen­te serão pas­sí­veis de individualização com a iden­ti­fi­ca­ção dos valo­res que lhes são sub­ja­cen­tes.

Nessa linha, a norma geral não mais ocupa uma posição externa, meramente condicionadora e delimitadora da atividade jurisdicional, terminando por assumir o status de objeto da própria função judicante. Partindo dos seus contornos abstratos, cabe aos órgãos jurisdicionais moldar o seu conteúdo à realidade ou mesmo expurgá-las da ordem jurídica, nesse último caso com o controle de constitucionalidade.

Na sentença de Recasens Siches, “la norma individualizada es la única norma jurídica perfecta, porque es la única capaz de ser impuesta inexorablemente, ejecutada coercitivamente, si esto fiera necesario. Solo la norma jurídica individualizada es la que tiene plenitud de sentido, porque articula la directriz de la norma general con la realidad de la vida, que es siempre concreta y particular”.[10] A atividade de produção normativa desempenhada pelos tribunais assume uma feição essencialmente escalonada. Atuam a partir do direito posto pelo legislador, interpretando-o e integrando-o sempre que necessário.

Não identificado, na norma geral, um alicerce idôneo à formação da norma individual, caberá ao juiz socorrer-se de outras fontes de Direito (v.g.: os costumes) para suprir a incompletude do ordenamento. Essa possibilidade, que consubstancia um “princípio essencial e necessário de qualquer ordenamento jurídico”, assegurando a segurança social, é indicativa da “plenitude hermética da ordem jurídico-positiva formalmente válida”.[11]

A atividade de integração do ordenamento jurídico manifesta-se tanto nas hipóteses em que seja detectada uma lacuna legis como nas situações em que a própria norma remeta ao intérprete a atividade de densificação do seu conteúdo, o que assume particular relevância com a profusão de conceitos jurídicos indeterminados (v.g.: ordem pública) e com o reconhecimento do caráter normativo dos princípios jurídicos no constitucionalismo contemporâneo.

O reconhecimento da individualidade existencial do Direito Judicial tem encontrado resistências que repousam numa interpretação restritiva do princípio da divisão das funções estatais e na imperativa vinculação dos tribunais à Constituição e à lei, alicerce último do próprio princípio democrático, sendo freqüentemente contestada a sua legitimidade.

 

3. Direito Judicial e Legitimidade do Poder Judiciário. A contínua ampliação do papel desempenhado pelos órgãos jurisdicionais no delineamento das normas de conduta mantém vivo o debate em torno de sua legitimidade democrática. A tese da ilegitimidade, sequer suscitada pela doutrina clássica, que lhes condicionava o obrar à letra da lei e preconizava uma verdadeira automação na sua aplicação, não é inovadora, mantendo contornos em muito semelhantes àqueles suscitados no processo de sedimentação da jurisprudência como fonte de Direito.

Afinal, se os órgãos jurisdicionais não detêm a representatividade democrática, como podem contribuir para a definição do alcance da norma geral ou mesmo integrá-la no caso de lacuna? Por identidade de razões, como podem obstar a aplicação de uma norma geral, possibilidade inerente ao controle de constitucionalidade, ou integrar os próprios contornos da norma com a densificação dos princípios jurídicos e dos demais conceitos jurídicos indeterminados?

Embora seja a função legislativa a sua natural expressão, em sistemas democráticos dotados de mecanismos de checks and balances, o poder político também se projeta na função jurisdicional, o que se faz sentir na fiscalização abstrata de constitucionalidade e na persecução de crimes de responsabilidade, isto sem olvidar os influxos ideológicos que naturalmente não se desprendem dos juízes no exercício de sua atividade judicante.[12] Em Estados autoritários, o poder político termina por subjugar a própria função jurisdicional, o que em muito compromete a sua importância como fonte de Direito.[13]

Em um primeiro plano, deve-se ressaltar que a ratio do controle exercido pelo Poder Judiciário é a de velar para que o exercício do poder man­te­nha uma rela­ção de ade­qua­ção com a ordem jurídica, subs­tra­to legi­ti­ma­dor de sua exis­tên­cia. Tal, no entanto, provocará uma inevitável tensão entre dois valores indispensáveis ao correto funcionamento do sistema constitucional: o primeiro indica que o poder de decisão numa democracia deve pertencer aos eleitos - cuja responsabilidade pode ser perquirida – e, o segundo, a existência de um meio que permita a supremacia da Constituição mesmo quando maiorias ocasionais, refletidas no Executivo ou no Legislativo, se oponham a ela.[14]

O absolutismo ou mesmo o paulatino distanciamento das opções políticas fundamentais fixadas pelo Constituinte pode igualmente derivar das maiorias ocasionais, as quais, à míngua de mecanismos eficazes de controle, podem solapar as minorias e comprometer o próprio pluralismo democrático. Por tal razão, não se deve intitular uma decisão judicial de antidemocrática pelo simples fato de ser identificada uma dissonância quanto à postura assumida por aqueles que exercem a representatividade popular. Não se afirma, é certo, que a democracia seja algo estático, indiferente às contínuas mutações sociais. No entanto, ainda que a vontade popular esteja sujeita a contínuas alterações, o que resulta de sua permanente adequação aos influxos sociais, refletindo-se nos agentes que exercem a representatividade popular, ela deve manter-se adstrita aos contornos traçados na Constituição, elemento fundante de toda a organização política e que condiciona o próprio exercício do poder.

Não merece acolhida, inclusive, a tese de uma possível supremacia do Judiciário em relação aos demais poderes. As suas vocações de mantenedor da “paz institucional” e de garantidor da preeminência do sistema jurídico assumem especial importância no Estado Social moderno, no qual aumenta a importância do Estado em relação ao indivíduo, com a correlata dependência deste para com aquele, exigindo do Judiciário o controle dessa relação.[15]

Robert Alexy,[16] embora discorrendo sobre a competência do Tribunal Constitucional, profere lição que em muito contribui para a elucidação da tensão dialética acima enunciada. Segundo ele, “a chave para a reso­lu­ção é a dis­tin­ção entre a repre­sen­ta­ção polí­ti­ca e a argu­men­ta­ti­va do cida­dão”.[17] Estando ambas submetidas ao princípio fundamental de que todo o poder emana do povo, é necessário compreender “não só o par­la­men­to mas tam­bém o tri­bu­nal cons­ti­tu­cio­nal como repre­sen­ta­ção do povo”. Essa representação, no entanto, se manifesta de modo distinto: “o par­la­men­to repre­sen­ta o cida­dão poli­ti­ca­men­te, o tri­bu­nal cons­ti­tu­cio­nal argu­men­ta­ti­va­men­te”, o que permite concluir que este, ao representar o povo, o faz de forma “mais idea­lís­ti­ca” que aque­le. Ao final, realça que o cotidiano parlamentar oculta o perigo de que faltas graves sejam praticadas a partir da excessiva imposição das maiorias, da preeminência das emoções e das manobras do tráfico de influências, o que permite concluir que “um tri­bu­nal cons­ti­tu­cio­nal que se diri­ge con­tra tal não se diri­ge con­tra o povo, senão, em nome do povo, con­tra seus repre­sen­tan­tes polí­ti­cos”.

Conferindo-se à Constituição a condição de elemento polarizador das relações entre os poderes, torna-se evidente que os mecanismos de equilíbrio por ela estabelecidos não podem ser intitulados de antidemocráticos. Além disso, a ausência de responsabilidade política dos membros do Poder Judiciário não tem o condão de criar um apartheid em relação à vontade popular. Na linha de Bachof, o juiz não é menos órgão do povo que os demais, pois, mais importante que a condição de mandatário do povo é a função desempenhada “em nome do povo”,[18] aqui residindo a força legitimante da Constituição. Essa fórmula, aliás, mereceu consagração expressa no art. 202, no 1, da Constituição portuguesa: “os tribunais são órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo”. [19]

 

4. A Dicotomia Norma Geral – Norma Individual. Como desdobramento lógico da clássica teoria de Montesquieu, sedimentou-se a concepção de que a atividade dos órgãos jurisdicionais deveria assumir contornos essencialmente silogísticos: a premissa maior estaria consubstanciada na norma geral e abstrata, a premissa menor na situação fática e a conclusão na decisão judicial. Em outras palavras, ter-se-ia uma operação mecânica, um exercício de mera subsunção dos fatos à norma, com os efeitos nesta previstos.

O evolver da metodologia jurídica, no entanto, não permitiu permanecesse tal concepção incólume aos vícios intrínsecos que a acompanhavam desde o nascedouro. Embora não se contestasse que cada órgão estatal estava primordialmente incumbido do exercício de determinado feixe de atividades, dogma do qual não se afastavam o Legislativo e o Judiciário, reconheceu-se, de forma lenta e gradual, que os momentos de criação e de aplicação do Direito não ocupavam compartimentos estanques, dissociados entre si, cada qual sob a senhoria absoluta de certos órgãos. Pelo contrário, normas gerais e normas individuais aproximam-se e integram-se, formando uma verdadeira unidade de sentido. A norma geral e abstrata não esgota o conteúdo das relações jurídicas que deve regular, devendo ser integrada pelas especificidades do caso concreto, do que resultará o delineamento da norma individual, com a correlata produção dos efeitos previstos, em potência, na norma geral.

As impropriedades do raciocínio silogístico podem ser identificadas a partir das técnicas utilizadas para a individualização dos dois alicerces fundamentais da conclusão a ser alcançada: a premissa maior e a premissa menor.[20]

A mecanicidade da atividade é de logo afastada com a mera tarefa de fixação da premissa maior: identificar a norma vigente e aplicável, desvendando o seu conteúdo, solucionando conflitos aparentes de normas no tempo e no espaço ou mesmo colmatando lacunas, é operação de índole essencialmente valorativa e que em muito desborda a simplicidade operativa preconizada pela teoria clássica, passando ao largo de uma mera lógica formal. A premissa de que a norma geral tem natureza unívoca não encontra ressonância na realidade, sendo intuitivo, como dissemos, que uma atividade puramente cognoscitiva ceda lugar a uma atividade de cunho valorativo. Dessa constatação resulta outra: na delimitação e ulterior aplicação da norma é divisada uma certa margem de liberdade, maior ou menor conforme o caso, na individualização da norma geral, o que pode ensejar o surgimento do que alguns denominam de discricionariedade judicial.[21]

Também a premissa menor não consubstancia algo preexistente na natureza e perceptível aos sentidos: a situação fática deve ser reconstruída perante o órgão jurisdicional, daí derivando toda a gama de discussões inerentes aos seus poderes instrutórios e à eleição do paradigma ideal de convencimento, a verdade real ou a verdade formal, isto sem olvidar os aspectos associados à sua própria percepção. Nessa operação de delineamento da base fática e da conseqüente filtragem dos aspectos relevantes, o juiz não se limita à apreensão do fato juridicamente descontextualizado, projeta a realidade pelas lentes da norma, o que já é indicativo de que não realiza uma operação seqüencial – norma geral no antecedente, fato no conseqüente -, como a técnica do silogismo poderia sugerir. Fato e norma interpenetram-se, de modo que do juízo de fato[22] desprende-se um inevitável juízo de valor, ainda que antecedente ao juízo de valor definitivo a ser realizado com o delineamento da norma individual à luz da norma geral.

A interpenetração dos juízos valorativos na premissa maior e na premissa menor permite concluir que as decisões judiciais consubstanciam estruturas complexas, mas essencialmente unitárias. Cada um dos aspectos que influenciaram a sua formação intelectiva, resultado de múltiplos juízos valorativos, articula-se com os demais de modo a formar um “ato mental indivisível”,[23] ainda que, na forma, apresente uma aparência de silogismo. Os juízos valorativos, no entanto, devem manter-se adstritos ao ordenamento jurídico, refletindo os valores sociais, “no la audacia del juez y su pretensión protegonista”.[24]

 

5. O Direito Judicial e a Preservação da Constituição. Nos Estados que adotem o modelo de controle concentrado de constitucionalidade, é factível a existência de uma força determinante da jurisprudência constitucional,[25] cabendo ao Tribunal Constitucional[26] cotejar a produção normativa com os contornos da ordem constitucional, assegurando a preeminência desta. Não raras vezes, mesmo o controle difuso, característico do sistema norte-americano, permite que o Tribunal tenha uma decisiva influência na própria evolução da sociedade.[27]

Os tribunais, no entanto, atuam secundum constitucionis, não podendo criar paradigmas de controle não contemplados nesta ou substituir-se ao legislador em suas opções políticas.

Em alguns sistemas, à sentença que tão-somente reconheça que a lei impugnada não contraria a Constituição não é atribuída força de lei. Argumenta-se que entendimento contrário criaria a suposição de que a lei não poderia ser atacada no futuro, salvo pelo próprio legislador, impedindo que o Tribunal viesse a reexaminar a sua constitucionalidade, o que terminaria por atribuir-lhe valor similar ao da própria Constituição.[28]  

No que concerne à discricionariedade legislativa para a edição de uma nova norma geral, os efeitos da declaração de inconstitucionalidade em sede de fiscalização abstrata apresentam variações, havendo sistemas que contraditoriamente aceitam a reedição de norma idêntica pelo legislador[29] e outros que, prestigiando o efeito erga omnes da decisão, extensivo aos particulares e às autoridades públicas, vedam que o legislador reproduza a norma sem prévia alteração da norma constitucional com ela incompatível, conferindo-lhe verdadeira “força de lei”.[30] Nesse último caso, realça-se o papel do Direito Judicial, que assume feições não só supressivas como obstativas.

 

6. As Omissões Legislativas e o Direito Judicial. Nas omissões legislativas, quer totais, com a não integração de eficácia de normas constitucionais,[31] quer parciais, com a violação ao princípio da igualdade na sua integração, são múltiplas as questões que envolvem os limites e as potencialidades do Direito Judicial.

Tratando-se de norma constitucional dependente de intervenção legislativa para a obtenção de ampla eficácia, a não edição da legislação exigida, no lapso fixado ou em prazo razoável, caracterizará uma omissão inconstitucional, o que, no entanto, não permite que o Judiciário, sem expressa autorização constitucional, no exercício de uma representatividade democrática que efetivamente não possui, substitua-se ao Legislador e supra a omissão, editando uma norma ornada com os atributos da generalidade e da abstração.[32] Em situações tais, como a maior expressão de ingerência dos tribunais na atividade legislativa, tem-se reconhecido, por expressa previsão constitucional[33] ou a partir de uma interpretação construtiva,[34] a possibilidade de declararem a ilicitude da conduta, cientificando o órgão responsável pela omissão, não sendo prestigiado o Direito Judicial substitutivo. Essa mera comunicação ao legislador, não é preciso realçar, pouco ou nenhum resultado prático tem produzido, o que justifica a reduzida utilização dessa técnica em muitos Estados.[35]

Resultado mais satisfatório, sob o prisma da máxima efetividade das normas constitucionais, pode ser alcançado não com a prolação de decisão substitutiva da própria lei, mas com uma reengenharia interpretativa das disposições normativas já existentes, nelas reconhecendo o potencial de integração da Constituição ou mesmo a sua aplicação direta. A atividade dos tribunais afasta-se da abstração inerente à lei e volta-se ao caso concreto, não chegando propriamente a constituir um regramento de cunho geral, o que é indicativo de um Direito Judicial concorrente com a normativa preexistente, quer constitucional, quer legal.

O Tribunal Constitucional espanhol, em leading case, valorando a omissão legislativa na regulamentação do art. 30, nº 2, da Constituição, que remetia à lei a disciplina, com as devidas garantias, da objeção de consciência, concluiu que a norma constitucional, embora dependente de conformação legislativa, tinha um conteúdo mínimo que não podia ser ignorado.[36] Posta a premissa, entendeu que esse conteúdo mínimo somente seria observado com a “suspensão provisória da incorporação ao serviço militar” daqueles que invocassem a objeção de consciência.[37]

Em outro momento, face à inexistência de regulamentação legal relativa à exploração de televisão por cabo de âmbito local, o Tribunal vislumbrou nessa omissão uma proibição total ao acesso aos meios de comunicação, o que contrariava a norma constitucional que assegurava a liberdade de expressão e de comunicação, bem como a criação dos meios de difusão da informação (art. 20, nº 1, alíneas a e d).[38] Por tal razão, entendeu que, enquanto não editada a norma delineando os requisitos a serem preenchidos para o deferimento da autorização administrativa, era livre a exploração dessa atividade.  

Tal haverá de ser a solução nas situações de “necessidade extrema e excepcional” - necessitas non habet legem -,[39] em que a preservação da dimensão axiológico-teleológica da Constituição formal exija um provimento jurisdicional que preserve os valores essenciais ainda não resguardados por uma legislação que a integre e potencialize sua eficácia.

Somente nas omissões consideradas absolutas,[40] que geram, no plano infraconstitucional, lacunas não colmatáveis (unausfüllbare Lücke), será defeso ao Judiciário avançar na atividade de integração da Constituição, necessariamente dependente da concretização legislativa. Nessa linha, o Tribunal Constitucional espanhol, ao apreciar questão envolvendo a ausência de regulamentação legal do regime de concessão administrativa para a exploração de televisão local, não pôde encampar a tese de ser livre a exploração, permitindo a produção de um mínimo de eficácia pela norma constitucional que assegura a liberdade de expressão e de comunicação (art. 20, nº 1, alíneas a e d).[41] In casu, a decisão foi justificada por razões técnicas, pois a difusão dos sinais exigia uma prévia ordenação das freqüências de emissão, o que pressupunha a necessária intermediação legislativa na confecção da normativa geral e impedia fosse considerada livre a exploração da atividade.

Ainda com os olhos voltados ao caso concreto, não deve ser descartada a possibilidade de a Constituição permitir ao órgão jurisdicional que, suprindo a omissão legislativa, integre a norma constitucional com o fim de prestigiar valores essenciais ao Estado, como é o caso da preservação dos direitos fundamentais.[42] Aqui, o Direito Judicial atuará como substitutivo da lei, incursionando em esfera que lhe é inerente, o que redundará no redimensionamento da clássica divisão entre as funções estatais, tendo como desiderato final a preservação da própria razão de ser da organização estatal: o bem comum.[43] Como referencial de equilíbrio do sistema, é de todo conveniente que a decisão restrinja-se ao caso, resguardando-se o poder normativo geral inerente ao Legislativo.

Nas omissões legislativas parciais, em que o legislador atua com violação ao princípio da igualdade, excluindo do alcance da norma geral situações jurídicas em tudo similares àquelas por ela contempladas, releva analisar a postura a ser assumida pelo órgão jurisdicional e, por via reflexa, o papel do Direito Judicial.

Em linha de princípio, poderiam ser quatro as soluções alvitradas pelo órgão jurisdicional ao reconhecer a inconstitucionalidade da discriminação: a) não aplicar a norma, mas proferir uma decisão que regule, sem violação ao princípio da igualdade, as situações por ela alcançadas; b) aplicar a norma ampliando o seu alcance às situações indevidamente excluídas; c) aplicar a norma, tal qual editada, sob o fundamento de que o vício parcial não obsta a produção de efeitos em relação às situações por ela alcançadas; e d) não aplicar a norma.

Na situação a ter-se-ia o Direito Judicial substitutivo da lei; na situação b o corretivo; na situação c o concorrente; e na situação d o supressivo. Embora haja grande resistência em relação às duas primeiras possibilidades, isto em razão da acentuada incursão em atividade que originariamente recai sobre o Legislativo, não é oposto qualquer óbice à terceira, que reflete o exercício da função jurisdicional nos seus contornos mais simples, sendo a última amplamente aceita nos sistemas que contemplam o controle de constitucionalidade, o que é o caso do Direito brasileiro.

No Direito Judicial concorrente, há interpretação e aplicação da disposição normativa posta pelo legislador; no supressivo, há interpretação e não aplicação da disposição normativa, prestigiando-se a preeminência da Constituição, norma superior e que deve consubstanciar o seu fundamento de validade. Em ambos os casos, o Judiciário parte de uma norma geral: no primeiro alcançando a individualização da norma individual; no segundo reconhecendo a impossibilidade de formulá-la. Por identidade de razões, cremos que a incidência do Direito Judicial corretivo não deve ser descartada.

Editada a disposição normativa de caráter geral, oxigenada pela opção política do órgão de representação democrática, não vislumbramos qualquer rompimento metodológico no obrar do órgão jurisdicional que proceda à sua interpretação, necessariamente direcionada pelas normas constitucionais, dentre as quais o princípio da igualdade, e delineie a norma individual de modo a alcançar aquele que, embora excluído, devesse ser necessariamente por ela alcançado. Em situações como essa, não visualizamos a mais remota usurpação da função legislativa, isto porque a norma geral, ao ser transposta da abstração de suas linhas estruturais para a realidade, o será em harmonia com os influxos constitucionais. Aliás, soa absurdo imaginar que a Constituição, ao conferir liberdade ao legislador para delinear o conteúdo da norma e negar-lhe toda e qualquer liberdade para excluir alguns dos destinatários em potencial, não pudesse ser diretamente aplicada pelo Judiciário, que, longe de substituir-se ao legislador, aplicaria a norma sob uma perspectiva corretiva, compatibilizando-a com o seu fundamento de validade.

Também merece menção o entendimento prestigiado pela Corte Costituzionale italiana, que não visualiza qualquer incompatibilidade lógica na utilização do seu poder anulatório em relação à omissão legislativa.[44] Em outras palavras, a omissão, no contexto teleológico-sistemático da norma geral, adquire a essência e os efeitos de uma norma negatória, a qual, na medida em que dissonante do princípio da igualdade, justifica a sua supressão, de modo a tornar efetivo e integral o potencial regulatório da norma.[45] A exclusão, o limite e a proibição, quer expressos, quer implícitos, são ontologicamente invariáveis, o que legitima a identidade de tratamento.

Tratando-se de violação ao princípio da igualdade resultante não de omissão legislativa, mas de preceito expresso, excluindo determinadas situações do alcance da norma, é de todo cabível a sua supressão, com a conseqüente correção do alcance da norma geral e a sua extensão às situações objeto da exclusão inconstitucional. Decisão dessa natureza, de conteúdo essencialmente positivo, foi proferida pelo Tribunal Constitucional português no Acórdão nº 203/1986, em sede de fiscalização concreta: a questão versava sobre norma que, em matéria de atualização de pensões decorrentes de acidentes do trabalho, terminou por dispensar tratamento menos favorável aos antigos beneficiários da pensão em decorrência da edição de normas mais favoráveis aos novos beneficiários, discriminação considerada arbitrária pelo Tribunal, do que resultou o reconhecimento da inconstitucionalidade das normas anteriores e na extensão do regime mais favorável a todos os beneficiários.[46] A mesma questão voltou a ser apreciada em sede de fiscalização abstrata, tendo o Tribunal, no Acórdão nº 12/1988, declarado a inconstitucionalidade, com efeitos erga omnes, das normas que integravam o regime menos favorável, na medida em que restringissem a aplicação do regime mais favorável.[47]    

Questão tormentosa, no entanto, e que invariavelmente redundará numa postura de auto-contenção dos tribunais, reside nos efeitos financeiros decorrentes do Direito Judicial corretor da lei. Enquanto a ampliação das garantias individuais, em especial com o realinhamento da esfera jurídica imune à atuação estatal, redundará num non facere, a extensão de direitos prestacionais (v.g.: a indevida concessão de aumento remuneratório somente a determinada categoria do funcionalismo público) inicialmente não previstos na norma culminará com um dare, com inevitável impacto nas finanças públicas.[48]

Apesar do inegável cunho educativo que ostenta o Direito Judicial supressivo, evitando que omissões parciais sejam praticadas e perpetuadas sob o abrigo da inviabilidade financeira de a norma ser estendida a todos aqueles que se encontrem em situação jurídica similar, não se pode ignorar os seus efeitos deletérios. Suprimida a regulamentação parcial, não restará regulamentação alguma. A coexistência de padrões de legitimidade e de ilegitimidade, ambos parciais, cederá lugar à ilegitimidade total, prejudicando parcela maior da coletividade que aquela alcançada pela norma quando em vigor.  

 

7. O Direito Judicial e a Densificação das Normas Constitucionais de Estrutura Aberta. A paulatina maturação da con­cep­ção posi­ti­vis­ta clássica, que vedava ao intér­pre­te qualquer con­si­de­ra­ção de ordem axio­ló­gi­ca e limi­tava a sua ati­vi­da­de a uma ope­ra­ção de mera sub­sun­ção do fato à norma, sofreu toda sorte de influxos, na medida em que a pró­pria incom­ple­tu­de do orde­na­men­to jurí­di­co, de ten­dên­cia cres­cen­te ante a impos­si­bi­li­da­de de ime­dia­ta ade­qua­ção da norma aos influ­xos sociais, tornava ine­vi­tá­vel que o ope­ra­dor do Direi­to viessa a sope­sar os valo­res comuns a deter­mi­na­do gru­pa­men­to para fins de integração da própria norma. Para essa concepção, as nor­mas se con­fundiam com as regras de con­du­ta que vei­cu­la­vam, sendo os prin­cí­pios uti­li­za­dos, pri­mor­dial­men­te, como ins­tru­men­tos de inter­pre­ta­ção e inte­gra­ção daque­las.

Hodiernamente, tem-se uma fase pós-positivista, em que os prin­cí­pios dei­xam de ser meros com­ple­men­tos das regras, pas­san­do a ser vis­tos como for­mas de expres­são da pró­pria norma, que é sub­di­vi­di­da em regras e prin­cí­pios.[49] Os prin­cí­pios, a exem­plo das regras, car­re­gam con­si­go acen­tua­do grau de impe­ra­ti­vi­da­de, exi­gin­do a neces­sá­ria con­for­ma­ção de qual­quer con­du­ta aos seus dita­mes, o que deno­ta o seu cará­ter nor­ma­ti­vo (dever ser). Sendo cogen­te a obser­vân­cia dos prin­cí­pios, o ato que deles des­toe será invá­li­do, con­se­qüên­cia esta que repre­sen­ta a san­ção para a inob­ser­vân­cia de um padrão nor­ma­ti­vo cuja reve­rên­cia é obri­ga­tó­ria.

Em razão de seu maior grau de gene­ra­li­da­de, os prin­cí­pios vei­cu­lam dire­ti­vas com­por­ta­men­tais que devem ser apli­ca­das em con­jun­to com as regras sem­pre que for iden­ti­fi­ca­da uma hipó­te­se que o exija, o que, a um só tempo, acar­re­ta um dever posi­ti­vo para o agen­te – o qual deve ter seu atuar dire­cio­na­do à con­se­cu­ção dos valo­res que inte­gram o prin­cí­pio – e um dever nega­ti­vo, con­sis­ten­te na inter­di­ção da prá­ti­ca de qual­quer ato que se afas­te de tais valo­res. Constatada a ine­xis­tên­cia de regra espe­cí­fi­ca, maior impor­tân­cia assu­mi­rão os prin­cí­pios, os quais ser­vi­rão de norte à reso­lu­ção do caso apre­cia­do. Em sua dimensão integrativa, os princípios conferem maior unidade ao sistema normativo, possibilitando o estabelecimento de uma conexão entre as múltiplas regras que o compõem e permitindo que os valores que veiculam incidam de forma adequada e coerente sobre diferentes situações, afastando o risco de contradições no sistema.

A necessidade de densificação dos princípios constitucionais à luz dos valores sociais, com a imperiosa preservação da unidade do sistema, bem demonstra a importância assumida pelo Direito Judicial, o qual, embora atuando concorrentemente, vale dizer, em busca da consecução de fins comuns, integra os próprios contornos da norma geral.    

Quanto à identificação da linha limítrofe que separa as regras dos princípios, as con­cep­ções dou­tri­ná­rias podem ser sub­di­vi­di­das, basi­ca­men­te, em duas posi­ções: de acor­do com a pri­mei­ra, deno­mi­na­da de con­cep­ção fraca dos prin­cí­pios, a dis­tin­ção para com as regras é quan­ti­ta­ti­va, ou de grau; enquan­to a segun­da, inti­tu­la­da de con­cep­ção forte dos prin­cí­pios, sus­ten­ta que a dife­ren­ça é qua­li­ta­ti­va.

A con­cep­ção débil de prin­cí­pios está vin­cu­la­da a uma visão posi­ti­vis­ta do Direito, não visua­li­zan­do uma dis­tin­ção subs­tan­cial em rela­ção às regras, mas, uni­ca­men­te, uma maior gene­ra­li­da­de e abs­tra­ção, o que con­duz os prin­cí­pios à con­di­ção de nor­mas fun­da­men­tais do sis­te­ma e lhes con­fe­re um gran­de valor her­me­nêu­ti­co, sem apti­dão, con­tu­do, para for­ne­cer uma uni­da­de de solu­ção no caso con­cre­to.

A con­cep­ção forte de prin­cí­pios iden­ti­fi­ca dis­tin­ções sob os aspec­tos lógi­co e qua­li­ta­ti­vo, o que indi­vi­dua­li­za os prin­cí­pios como nor­mas jurí­di­cas que se dife­ren­ciam das regras em razão de sua com­po­si­ção estru­tu­ral. A impe­ra­ti­vi­da­de da ordem jurí­di­ca não se esgo­ta­ria na pre­vi­são explí­ci­ta das regras jurí­di­cas, estendendo-se aos valo­res con­subs­tan­cia­dos nos prin­cí­pios.[50] Ante o pres­tí­gio aufe­ri­do por essa con­cep­ção, para a qual con­ver­ge a gran­de maio­ria dos estu­dos con­tem­po­râ­neos, tece­re­mos bre­ves con­si­de­ra­ções a res­pei­to de dois de seus maio­res expoen­tes.

Para Dworkin,[51] um dos maio­res cul­to­res da meto­do­lo­gia jurí­di­ca con­tem­po­râ­nea, os prin­cí­pios se dis­tan­ciam das regras na medi­da em que per­mi­tem uma maior apro­xi­ma­ção entre o direi­to e os valo­res sociais, não expres­san­do con­se­qüên­cias jurí­di­cas que se imple­men­tam auto­ma­ti­ca­men­te com a sim­ples ocor­rên­cia de deter­mi­na­das con­di­ções, o que impe­de que sejam pre­vis­tas, a prio­ri, todas as suas for­mas de apli­ca­ção. A efe­ti­vi­da­de dos prin­cí­pios não é resul­ta­do de uma ope­ra­ção mera­men­te for­mal e alheia a con­si­de­ra­ções de ordem moral. Os prin­cí­pios ter­mi­nam por indi­car deter­mi­na­da dire­ção, mas não impõem uma solu­ção em par­ti­cu­lar.

A dis­tin­ção lógi­ca entre regras e prin­cí­pios é evi­den­cia­da por Dworkin ao dizer que “ambos esta­be­le­cem stan­dards que apon­tam para deci­sões par­ti­cu­la­res sobre obri­ga­ções jurí­di­cas em cir­cuns­tân­cias deter­mi­na­das, mas distinguem-se quan­to ao cará­ter de dire­ção que esta­be­le­cem. Regras são apli­cá­veis à manei­ra do tudo ou nada. Se ocor­rem os fatos esti­pu­la­dos pela regra, então ou a regra é váli­da, caso em que a respos­ta que for­ne­ce deve ser acei­ta, ou não é, caso em que em nada con­tri­bui para a deci­são”. Dessa dis­tin­ção deflui que os prin­cí­pios pos­suem uma dimen­são de peso, o que influi­rá na solu­ção dos con­fli­tos, per­mi­tin­do a iden­ti­fi­ca­ção daque­le que irá pre­pon­de­rar. Quanto às regras, por não apre­sen­ta­rem uma dimen­são de peso, a coli­são entre elas será resol­vi­da pelo pris­ma da vali­da­de, ope­ra­ção que será dire­cio­na­da pelos cri­té­rios for­ne­ci­dos pelo pró­prio orde­na­men­to jurí­di­co: cri­té­rio hie­rár­qui­co (lex supe­rior dero­gat infe­rio­ri), cri­té­rio cro­no­ló­gi­co (lex pos­te­rior dero­gat prio­ri) e cri­té­rio da espe­cia­li­da­de (lex spe­cia­lis dero­gat gene­ra­li).

Segundo Robert Alexy,[52] enquan­to as regras impõem deter­mi­na­do padrão de con­du­ta, os prin­cí­pios são nor­mas jurí­di­cas impo­si­ti­vas de uma oti­mi­za­ção, orde­nan­do que algo seja rea­li­za­do na melhor medi­da pos­sí­vel, poden­do ser cum­pri­dos em dife­ren­tes graus,[53] sendo que a medi­da de seu cum­pri­men­to depen­de­rá tanto das pos­si­bi­li­da­des reais como tam­bém das jurí­di­cas. O âmbi­to das pos­si­bi­li­da­des jurí­di­cas é deter­mi­na­do pelos princípios opostos, que incidem na espécie e que igualmente buscam a prevalência de suas potencialidades, e pelas regras que, de algum modo, excepcionam o princípio que se pretende aplicar. Além de encer­ra­rem coman­dos de oti­mi­za­ção que varia­rão con­soan­te as cir­cuns­tân­cias fáti­cas e jurí­di­cas pre­sen­tes por oca­sião de sua apli­ca­ção, os prin­cí­pios apre­sen­tam pecu­lia­ri­da­des em rela­ção às regras.

Para o juris­ta ale­mão, os prin­cí­pios con­vi­vem har­mo­ni­ca­men­te, o que per­mi­te a sua coe­xis­tên­cia e que, em caso de con­fli­to, um deles seja pre­pon­de­ran­te­men­te apli­ca­do ao caso con­cre­to, a par­tir da iden­ti­fi­ca­ção de seu peso e da pon­de­ra­ção de outros prin­cí­pios, con­for­me as cir­cuns­tân­cias em que este­ja envol­to.[54] O con­fli­to entre regras, por sua vez, será solu­cio­na­do com a intro­du­ção de cri­té­rios de espe­cia­li­da­de entre elas ou com o reco­nhe­ci­men­to da inva­li­da­de de uma ou de algu­mas das regras con­fron­ta­das, per­mi­tin­do que seja iden­ti­fi­ca­da aque­la que regu­la­rá a situa­ção con­cre­ta. Aqui, dife­ren­te­men­te do que ocor­re com os prin­cí­pios, não se tem um exer­cí­cio de pon­de­ra­ção, mas uma forma de exclu­são, sendo cogen­te a apli­ca­ção da regra ao caso sempre que verificado o seu substrato fático típico. Enquanto os con­fli­tos entre regras são diri­mi­dos na dimen­são da vali­da­de, os con­fli­tos entre prin­cí­pios o são na dimen­são do peso.[55] Portanto, as regras con­tém deter­mi­na­ções no âmbi­to do fáti­co e juri­di­ca­men­te pos­sí­vel, o que sig­ni­fi­ca que a dife­ren­ça entre regras e prin­cí­pios, espé­cies do gêne­ro norma jurí­di­ca, é qua­li­ta­ti­va e não de grau.

Após essa sin­té­ti­ca abor­da­gem das dou­tri­nas de Dworkin e de Alexy, constata-se que a dis­tin­ção exis­ten­te entre regras e prin­cí­pios é melhor iden­ti­fi­ca­da a par­tir da visua­li­za­ção da espé­cie de solu­ção exi­gi­da para os casos de coli­são, o que nos leva a encam­par a con­cep­ção forte dos prin­cí­pios.

É de se notar, ainda, que a regra é um tipo de norma que, pre­sen­tes os pres­su­pos­tos auto­ri­za­do­res de sua apli­ca­ção, rege­rá deter­mi­na­da situa­ção fáti­ca ou jurí­di­ca, de forma incon­tes­tá­vel e defi­ni­ti­va. Princípio, por sua vez, é um tipo de norma cujos pres­su­pos­tos auto­ri­za­do­res de sua apli­ca­ção não assu­mem con­tor­nos pre­ci­sos, o que lhe con­fe­re maior impre­ci­são e menor deter­mi­na­bi­li­da­de, fazen­do com que atue como meio de oti­mi­za­ção de certo com­por­ta­men­to, impregnando-o com os valo­res extraí­dos das pos­si­bi­li­da­des fáti­cas e jurí­di­cas do caso.

De forma sin­té­ti­ca, pode-se dizer que a apli­ca­ção das regras pode se esgo­tar em uma ope­ra­ção de sub­sun­ção, enquan­to que os prin­cí­pios exigem uma atividade de concreção, densificando os valores incidentes no caso, e um exer­cí­cio de pon­de­ra­ção, per­mi­tin­do sejam sope­sa­dos os valo­res que infor­mam tal situa­ção fáti­ca, cul­mi­nan­do com a iden­ti­fi­ca­ção da solu­ção justa para o caso con­cre­to. Concreção e ponderação são manifestações inequívocas da importância assumida pele Direito Judicial na atualidade.

 

8. A Força Normativa dos Precedentes e a Generalização das Individualidades. Característica marcante dos sistemas de common law, identificados como um corpo central de normas não decorrentes propriamente do Direito escrito, mas, sim, dos padrões continuamente derivados das decisões judiciais,[56] a força normativa dos precedentes indica que os tribunais inferiores devem ficar adstritos à interpretação jurídica traçada pelos tribunais superiores, o que costuma ser identificado pelo princípio do stare decisis ou, em sua formulação completa, do stare decisis et non quieta movere.

Trata-se de um sistema baseado no case law, em que a elaboração da norma individual que regerá o caso concreto contribuirá para a integração e o evolver da norma geral. Em regra, embora não seja divisada propriamente uma precedência lógica da norma individual em relação à norma geral, é inegável que, apesar de condicionar e direcionar a construção daquela, o processo de formação da norma geral é desenvolvido a partir da norma individual, não sendo incomum o seu caráter inovador.

Os precedentes podem assumir contornos declarativos ou criativos.[57] Nos precedentes declarativos, os tribunais limitam-se a interpretar e a aplicar as normas já existentes, definindo o seu conteúdo e mantendo uma relação de continuidade no evolver da norma geral, o que consubstancia manifestação do Direito Judicial concorrente. Nos precedentes criativos, ao revés, como o próprio designativo indica, os tribunais inovam na ordem jurídica. Esse caráter inovador, é importante frisar, não é arrefecido mesmo nas hipóteses em que se busca reconduzir a decisão a uma norma já existente ou a um vetor interpretativo há muito sedimentado, parecendo um injustificável eufemismo afirmar que o direito sempre existiu, embora nunca tenha sido exercido ou atribuído a quem quer que seja.

A freqüência de emissão dos precedentes declarativos e dos criativos é diretamente proporcional ao grau de desenvolvimento do respectivo sistema jurídico. Em sistemas evoluídos, é nítida a preeminência dos precedentes declarativos, sendo possível que a evolução social e a reengenharia de sua escala de valores possam ser mais facilmente enquadráveis, com pequenas adequações interpretativas, nos paradigmas já existentes, evitando uma “evolução por saltos”, da essência dos precedentes criativos.

De positivo, destaca-se a importância dos precedentes na uniformização da atividade interpretativa do Direito, na preservação da segurança jurídica nas relações sociais, evitando-se a multiplicação de opiniões dissonantes entre os distintos órgãos jurisdicionais, e na conseqüente manutenção do princípio da igualdade.

De negativo, costuma-se argumentar que tal sistema compromete o evolver social, já que as decisões vinculativas são tomadas pelos escalões superiores e alcançam os inferiores, enquanto, de forma paradoxal, são justamente os últimos que possuem maior contato com a coletividade. Essa linha argumentativa, no entanto, é diluída na medida em que os pronunciamentos dos tribunais superiores costumam ser antecedidos por uma longa maturação da questão nas esferas inferiores, isto sem olvidar a possibilidade de serem revistos sempre que a evolução social o justifique.  

Sem prejuízo da crescente importância do statute law (rectius: direito escrito) nos sistemas de common law, em especial no Direito norte-americano, que conta, inclusive, com uma Constituição escrita, ainda é singular a importância dos precedentes. Nos sistemas de raiz romano-germânica, há muito a jurisprudência é considerada uma fonte formal de Direito, adquirindo um certo valor normativo anteriormente negado pela Revolução francesa.

Apesar de a jurisprudência ser considerada uma fonte formal de Direito nos sistemas romano-germânicos, não se costuma divisar o seu caráter vinculativo. A jurisprudência atua como vetor auxiliar na interpretação das disposições normativas e mecanismo de integração das lacunas existentes, o que não retira uma certa ascendência moral das decisões proferidas pelos tribunais superiores, em especial por indicarem a posição a ser adotada em sendo o caso por eles examinado em sede recursal. Apesar de os juízes estarem submetidos à lei, a jurisprudência é a lei aplicada pelos juízes, vale dizer, é a lei concreta, transposta da plasticidade de suas linhas estruturais para a realidade. Por privilegiarem o papel criativo da legislação, os sistemas de raiz romano-germânica não costumam tratar a jurisprudência como fonte de regras de direito, mas como fonte de Direito.[58]  

Não poucas vezes a jurisprudência tem assumido, inclusive, uma posição corretiva da norma geral de origem legislativa. Nesse particular, merece menção a responsabilidade civil dos patrões, amos e comitentes, independentemente de culpa, por atos de seus prepostos, empregados ou serviçais, possibilidade não contemplada no art. 159 do Código Civil de 1916, que exigia a culpa (“aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”), mas encampada pela jurisprudência e sedimentada no Enunciado nº 341 da Súmula da Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal (“É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”). É o que se convencionou chamar de culpa in eligendo, que importa no deslocamento da análise do elemento subjetivo para o momento da escolha do preposto, empregado ou serviçal, antecedente lógico do ato praticado, mas que com ele não se confunde.

O Direito brasileiro, de raiz romano-germânica, teve introduzido em seu sistema jurídico a denominada súmula vinculante, a ser editada exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal e de alcance restrito à matéria constitucional. Com efeito, na dicção do art. 103-A, com a redação dada pelo art. 2º da Emenda Constitucional nº 45/2004, o Tribunal “poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei”.[59] Como se percebe, além de adstrita a determinada matéria, a aprovação da súmula exige uma maioria qualificada (oito dos onze Ministros) e pressupõe a sedimentação de determinado entendimento no âmbito do Tribunal, o que é indicativo de sua excepcionalidade e da preocupação de não alijar os demais órgãos jurisdicionais do processo construtivo do Direito. Acresça-se que a “súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de disposições normativas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica” (art. 103-A, § 1º, da Constituição).

Essa súmula vinculante, no entanto, longe de ocupar um papel de destaque na própria criação da regra de direito, o que é da essência dos sistemas de common law, quando utilizada, desempenhará um papel essencialmente declarativo, fixando a interpretação de disposições normativas preexistentes. Isto, no entanto, não diminui a importância do Direito Judicial concorrente, que contribuirá para a exatidão de conteúdo da norma geral oriunda da disposição normativa posta pelo legislador, constituinte ou constituído.

           

Epílogo. Ainda que sejam tortuosos os percursos metodológicos conducentes à fundamentação do Direito Judicial, é inegável a influência projetada, no meio social, pelas decisões dos órgãos jurisdicionais, em especial dos tribunais superiores. Não é exagero afirmar que materializam o direito vivo, renovando sua essência a cada vaga de mutação social. O estudo do Direito Judicial estimula a identificação de suas virtualidades e permite a idealização de adequados mecanismos de controle, pois, na conhecida sentença de Lord Acton, “todo o poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente”.

Um breve tracejar das potencialidades dessa temática, ainda que acompanhado de imperfeições e incontáveis omissões, foi o nosso objetivo.

 

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[1] Com a edição do Act of Settlement, os juízes deixaram de ser demissíveis ad libitum do Rei, sendo-lhes assegurado o exercício das funções enquanto bem servissem ("quamdiu se bene gesserint"), fórmula repetida pelo art. III, seção I, da Constituição norte-americana, segundo a qual a nomeação dos juízes deve produzir efeitos “during good behaviour”. Cf. A. W. Bradley e K. D. Ewing, Constitutional and Administrative Law, Harlow: Pearson Education, 2003, p. 52.

[2] The Second Treatise of Government: Essay concerning the true original, extent and end of civil government, 3a ed., Norwich: Basil Blackwell Oxford, 1976, §§ 143-148. Obra originalmente publicada em 1690.

[3] Cf. De L’Ésprit des Lois, com notas de Voltaire, de Crevier, de Mably, de la Harpe e outros, Paris: Librairie Garnier Frères, 1927, Livro XI, Capítulo VI.

[4] Cf. Jurisdição Constitucional, São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 152. Combatendo o argumento de violação ao princípio da divisão dos poderes, afirmava Kelsen que “anular uma lei é estabelecer uma norma geral, porque a anulação de uma lei tem o mesmo caráter de generalidade que sua elaboração, nada mais sendo, por assim dizer, que a elaboração com sinal negativo e portanto ela própria uma função legislativa. E um tribunal que tenha o poder de anular as leis é, por conseguinte, um órgão do poder legislativo”. Ignácio de Otto (Derecho Constitucional, Sistema de Fuentes, Barcelona: Editorial Ariel, 2001, p. 285) acrescenta que também nas sentenças em que o Tribunal afasta determinada interpretação que considera inconstitucional (sentencias interpretativas de rechazo) é nítida a sua atuação como legislador, “en este caso positivo, en cuanto contribuye a concretar por exclusión el contenido del precepto legal examinado”.

[5] Cf. Jorge Miranda, Teoria do Estado e da Constituição, Coimbra: Coimbra Editora, 2002, p. 114.

[6] No Direito francês, ainda hoje, a posição do Judiciário em relação às demais estruturas de poder é nitidamente retraída, fruto da desconfiança decorrente da postura assumida pelos Parlements, constantemente opostos às tentativas de reforma realizadas pelo poder real no Ancien Régime, sendo esta uma das principais causas do imobilismo que provocou a Revolução. Cf. George Vedel, Droit Administratif, 5a ed., Paris: Presses Universitaires de France, 1973, p. 73. Observa Jean-Pierre Royer [Débat: Le juge sous la Ve République, in Revue du Droit Public no 5/6, p. 1853 (1865), 1998] que, quando os revolucionários franceses de 1791 empregaram o termo pouvoir, o fizeram no sentido latino de potestas, indicando uma prerrogativa politicamente inferior àquela da auctoritas na Roma antiga. O objetivo não foi realçar o Judiciário ou torná-lo um poder próprio, mas, sim, fixar os seus limites, senão mesmo torná-lo puissance nulle. A Constituição francesa de 1958 fala em autorité judiciaire, não fazendo referência expressa a um pouvoir. Com isto, à divisão dos poderes tem sido tradicionalmente atribuída uma feição bipolar, sendo conferida maior importância às relações institucionais estabelecidas entre Legislativo e Executivo, do que resultou uma posição secundária e nitidamente residual para o Judiciário. A grande instabilidade do sistema constitucional francês no período de 1789-1871, que se refletiu na edição de onze Constituições, é explicada pelo conflito entre princípios de legitimidade (a democrática e a monárquica) e de classes sociais (a burguesia urbana, que buscava sedimentar o poder, e a aristocracia rural, que pretendia manter o status quo). No período subseqüente, as tensões entre esses fatores políticos e sociais se amenizam e o sistema apresenta maior estabilidade. Os tribunais, no entanto, continuam a ser vistos com reserva, sendo-lhes subtraído, inclusive, o poder de fiscalização da constitucionalidade das leis (A Lei de 16-24 de agosto de 1790, em seu art. 13, interditava aos juízes o conhecimento de litígios ligados à ação administrativa, sendo a fórmula repetida na Constituição de 1791, cujo art. 3o vedava a suspensão de leis editadas pelo Poder Legislativo ou o controle da função administrativa, e na Lei de 16 fructidor do ano III da Revolução). As leis, por serem expressão da vontade geral, não poderiam ter a sua validade apreciada por órgãos estranhos à função legislativa. Somente com a Constituição de 1958 foi criado um órgão, eminentemente político, com competência para a fiscalização preventiva da constitucionalidade das leis: o Conselho Constitucional. Sua atuação antecede a promulgação da lei, não é automática e uma grande proporção da legislação escapa desse controle, quer por ser anterior à virada da jurisprudência em 1971, quer pelo órgão não ter sido provocado (em média, varia de 15 a 30% o quantitativo de leis submetidas a controle). Quanto às leis já promulgadas, o exame de sua constitucionalidade tem sido realizado quando da aferição da constitucionalidade de leis posteriores que às modifiquem (Decisión nº 99-410 DC, de 15/03/1999). Cf. Francis Hamon et alli, Droit Constitutionnel, 27ª ed., Paris: LGDJ, 2001, pp. 743/744. Diversamente do que se verifica em relação aos atos legislativos, o controle da adstrição da atividade administrativa aos parâmetros da lei teve grande desenvolvimento no Direito francês, tendo se mostrado essencial à salvaguarda dos direitos do indivíduo. A peculiaridade reside no fato desse controle não ser realizado pelos tribunais judiciais, mas por tribunais administrativos, cuja instância final é o Conselho de Estado.

[7] Cf. J. Ipsen, Richterrecht und Verfassung, Berlim: Duncker & Humblot, 1975, p. 231.

[8] Lembra Ignacio de Otto (op. cit., p. 291) que, apesar das recentes atenuações, na Inglaterra opera o efeito vertical dos precedentes, indicativo de que os tribunais estão vinculados às decisões anteriores que proferiram. Nos Estados Unidos, ao revés, sempre se reconheceu aos tribunais a possibilidade de mudar de critério, não estando vinculados aos próprios precedentes. Na Espanha, o Tribunal Constitucional, com esteio no princípio da igualdade (art. 14 da Constituição), tem decidido que uma decisão judicial dissonante de outra anterior deve ser necessariamente acompanhada das razões que justificaram a alteração de critério, o que não chega a constituir propriamente uma vinculação aos precedentes, sendo tão-somente exigida a motivação da decisão, não a idoneidade dos motivos declinados – daí se dizer que a observância do princípio da igualdade é “predominantemente formal” (Sentença nº 58/1986).

[9] Como observa Bachof (Jueces y Constitución, trad. de Rodrigo Bercovitz Rodrígues-Cano, Madrid: Editorial Civitas, 1985, p. 24), mesmo sob a égide do positivismo clássico, sempre se reconheceu ao juiz um papel importante na criação do direito, nunca tendo correspondido à conhecida concepção de Montesquieu, que o restringia à atividade de mera subsunção.

[10] Luis Recasens Siches, Introducción al Estúdio del Derecho, 14ª ed., México: Editorial Porrúa, 2003, p. 208.

[11] Luis Recasens Siches, op. cit., p. 205.

[12] Cf. Jorge Miranda, op. cit., p. 368; e Francis Hamon et alii, Droit Constitutionnel, 27ª ed., Paris: LGDJ, 2001, p. 743. Como assinala Paulo Bonavides (Curso de Direito Constitucional, 4ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 1993, p. 378), “a norma constitucional é de natureza política”, o que torna tarefa assaz difícil fazer com que sua aplicação de desprenda da essência que lhe é característica.

[13] Consoante o art. 121 da Constituição cubana de 1976, após as reformas aprovadas em 1992, “los Tribunales constituyen un sistema de órganos estatales, estructurados con independencia funcional de cualquier otro y sólo subordinados jerarquicamente a la Asamblea Nacional del Poder Popular y al Consejo de Estado”. O Consejo de Estado é órgão permanente da Asamblea e detém os supremos poderes do Estado (arts. 89 a 92 da Constituição), sendo o seu Presidente o Chefe de Governo (art. 93).

[14] Cf. A. Dick Howard, La protection des droits sociaux en droit constitutionnel américain, in Revue Française de Science Politique v. 40, nº 2, 1990, p. 188.

[15] Cf. Otto Bachof, op. cit., p. 58. Segundo o autor, o próprio controle, ao reconhecer a atuação em harmonia com o Direito, fortalecerá a autoridade dos demais poderes (p. 59).

[16] Direitos Fundamentais no Estado Constitucional Democrático, trad. de Luiz Afonso Heck, in RDA no 217/66, 1999.

[17] Como observa Ignacio Otto (op. cit., p. 289), “la diferencia entre política y derecho no es la que media entre decisión y deducción metódica, sino la que hay entre los diferentes modos de argumentación y fundamentación de los actos de una y otra clase”.

[18] Op. cit., p. 59.

[19] No mesmo sentido: art. 101 da Constituição italiana.

[20] Luis Recasens Siches, op. cit., pp. 199/204.

[21] Como bem observa Eros Roberto Grau (Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 3ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2005, pp. 52/53), “o juiz não produz normas livremente”. Em outras palavras, enquanto a discricionariedade indica um juízo de oportunidade, caracterizado pela liberdade de escolha entre dois ou mais comportamentos possíveis a partir da “ponderação comparativa dos vários interesses secundários (públicos, coletivos ou privados), em vista a um interesse primário” (Cf. Massimo Severo Gianini, Diritto Amministrativo, vol. 2º, 3ª ed., Milão: D. A. Giuffrè Editore, 1993, p. 49), a atividade jurisdicional, ainda que realize uma interpretação concretizadora e proceda a juízos de ponderação, não apresenta propriamente uma liberdade de escolha. A teleologia da norma consagra uma única solução justa, não uma multiplicidade de soluções justas. Multiplicidade de opções não significa liberdade de escolha, que não parece ser compatível com a noção de justiça inerente à função jurisdicional.

[22] Sobre a distinção entre giudizio di fatto e giudizio di valore, Norberto Bobbio (Il Positivismo Giuridico, Torino: G. Giappichelli, 1979, pp. 155/156) oferece o seguinte exemplo: “diante do céu rubro do pôr-do-sol, se eu digo: ‘o céu é rubro’, formulo um juízo de fato; se digo ‘este céu rubro é belo’, formulo um juízo de valor”. No plano da atividade judicial, ao juízo de fato “o céu é rubro” deve-se somar o juízo de valor “o céu rubro é belo” sempre que somente o último for juridicamente relevante, ensejando a incidência da norma geral.

[23] Luis Recasens Siches, op. cit., p. 203.

[24] Cf. Eduardo García de Enterría, La Constitución como Norma y el Tribunal Constitucional, 3ª ed., Madrid: Civitas Ediciones, 2001, p. 224.

[25] Cf. J.J. Gomes Canotilho, Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador, 2ª ed., Coimbra: Coimbra Editora, 2001, pp. 271/272.

[26] Inúmeros Estados concebem os Tribunais Constitucionais como estruturas organizacionais estranhas ao Judiciário, estando dissociados dos tribunais comuns e apresentando relevantes singularidades na sua própria composição, inclusive quanto ao lapso de permanência dos juízes nos respectivos cargos. À guisa de ilustração, a Corte Costituzionale italiana, órgão responsável pela realização do controle concentrado (controllo accentrato), é composta de quinze juízes, sendo um terço nomeado pelo Presidente da República, um terço pelo Parlamento e um terço pela Magistratura Superior (art. 135, 1, da Constituição de 1947), que ocuparão os cargos durante nove anos, vedada a recondução (art. 135, 3 e 4, da Constituição). Na Espanha, o Tribunal Constitucional é composto de doze juízes nomeados pelo Rei, com a participação, embora não paritária, de todas as estruturas de poder: quatro juízes são indicados pelo Congresso de Deputados, quatro pelo Senado, dois pelo Governo e dois pelo Conselho Geral do Poder Judicial, que ocuparão os cargos por um período de nove anos, renovando-se a terça parte do Tribunal a cada período de três anos (art. 159 da Constituição de 1978), o que evita rupturas bruscas de posições já sedimentadas. O Presidente do Tribunal será nomeado pelo Rei, dentre seus membros, a partir de proposta do Tribunal em sua composição plena, após votação secreta, para um período de três anos, admitida uma reeleição (art. 160 da Constituição e art. 9º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional – Lei nº 2/1979). A fixação de um número par de juízes termina por ocasionar problemas nas votações, não sendo incomum que o empate seja resolvido com o voto de qualidade do Presidente, que passa a dispor de dois votos (v.g.: Sentenças nº 111/1983 e Sentença nº 53/1985). No Direito norte-americano, que somente contempla o controle difuso de constitucionalidade, a Suprema Corte é o órgão de cúpula do Judiciário e os seus juízes são vitalícios, na verdadeira acepção da palavra, ou seja, poderão atuar enquanto vivos estiverem (art. III, Seção 1, da Constituição de 1787). No Direito brasileiro, o Supremo Tribunal Federal, última instância no controle difuso e órgão responsável pelo controle concentrado das normas em face da Constituição da República, é integrado por onze Ministros que necessariamente se aposentarão ao atingirem a idade prevista na Constituição.

[27] Nesse particular, é singular a importância da Suprema Corte norte-americana, bastando lembrar a sua influência na deflagração da guerra de secessão, ao prestigiar a postura escravagista dos Estados do sul (Case Dread Scott vs. Sandford, 1957); ao criar sérios embaraços na implementação da política econômica do New Deal (Cases Home Building & Loan Assn vs. Blaisdell, 1934; Nebbia vs. New York, 1934; Schechter Poultry Corp. vs. United States, 1935; e United Staes vs. Butler, 1936); ao estimular o fim da segregação racial (Case Brown vs. Board of Education, 1954) e ao assumir uma postura favorável ao aborto em determinadas circunstâncias (Case Roe vs. Wade, 1973). Cf. Peter Irons, A People´s History of the Supreme Court, Nova Iorque: Pinguin Books, 2000.

[28] É o que sustenta, no Direito espanhol, Ignacio de Otto, op. cit., p. 287.

[29] É o caso brasileiro: art. 28, parágrafo único, da Lei nº 9.868/1999. Na jurisprudência do STF: “Reclamação: cabimento para garantir a autoridade das decisões do STF no controle direto de constitucionalidade de normas: hipóteses de cabimento hoje admitidas pela jurisprudência (precedentes), que, entretanto, não abrangem o caso da edição de lei de conteúdo idêntico ou similar ao da anteriormente declarada inconstitucional, à falta de vinculação do legislador à motivação do julgamento sobre a validez do diploma legal precedente, que há de ser objeto de nova ação direta” (Pleno, ADIMC nº 1.850/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 02/09/1998, DJU de 27/04/2001, p. 57). Consoante o art. 461, do Código de Processo Civil, voltado às lides concretas, “a sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas”. Em sede de controle abstrato de constitucionalidade, tem prevalecido o entendimento de que o dispositivo do acórdão somente alcança a norma impugnada, não as razões que conduziram à declaração de inconstitucionalidade, não importando em violação à coisa julgada a edição de norma com idêntico conteúdo, desde que possua contornos formais distintos.  

[30] No Direito alemão, a Grundgesetz, ao tratar do Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional Federal), dispõe que “uma lei federal regulará a sua organização e processo, determinando os casos em que as suas decisões terão força de lei” (art. 94), tendo a respectiva Lei Orgânica conferido efeito vinculante às decisões do Tribunal. É também o exemplo português: Jorge Miranda, Teoria..., p. 214. No Direito espanhol, a Constituição reza que as decisões “que declaren la inconstitucionalidad de una ley o de una norma con fuerza de ley, y todas las que no se limiten a la estimación subjetiva de un derecho, tienen plenos efectos frente a todos” (art. 164), ao que se soma a Lei Orgânica do Tribunal, segundo a qual “las sentencias recaídas en procedimientos de inconstitucionalidad tendrán el valor de cosa juzgada, vincularán a todos los Poderes Públicos y producirán efectos generales desde la fecha de su publicación en el Boletín Oficial Del Estado”. No Direito francês, que somente contempla o controle preventivo-abstrato, realizado por órgão de feição não-jurisdicional, as decisões do Conseil Constitutionnel, declarando a inconstitucionalidade de disposições de lei ou impondo determinadas reservas de interpretação, fazem coisa julgada, alcançando todos os poderes públicos. Embora façam coisa julgada, não alcançam dispositivos de outra lei com termos distintos, salvo se, apesar de a redação ser diversa, tenha, na substância, um objeto análogo às disposições declaradas inconstitucionais (Decisión 89-258 DC, 08/07/1989, Dix Renault). Como entende o Conselho, a autoridade da coisa julgada se vincula ao controle da norma, não ao controle da disposição (Decisión Modernization Sociale, 12/01/2002). Cf. Louis Favoreau et alii, Droit Constitutionnel, 6ª ed., Paris: Dalloz, 2003, p. 310).

[31] Cf. J. Ipsen, op. cit., pp. 80 e ss e J. J. Gomes Canotilho, Constituição ..., pp. 272 e ss, que estudam as três primeiras categorias enunciadas: 1) gesetzeskorrigierendes Richterrecht; 2) gesetzkonkurrierendes Richterrecht; e 3) gesetzes vertretendes Richterrecht.

[32] Merece realce que embora seja reconhecido o dever de o legislador desempenhar o seu munus, tal não redunda no correlato surgimento de um direito subjetivo à legislação, consoante o seu delineamento clássico (relação jurídica polarizada pelo dever de prestar e pelo direito de exigir e passível de ser apreciada pelos órgãos jurisdicionais). Existe o dever, mas ao direito não pode ser dada operacionalidade prática, isto porque não pode o Judiciário compelir o Legislativo a idealizar, propor, discutir, votar e aprovar um padrão normativo, atividades de índole voluntarista e que ultrapassariam todos os limites razoáveis para a execução específica da obrigação de fazer. Cf. J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 6ª ed., Coimbra: Coimbra Editora, 2002, pp. 1026/1027.

[33] A primeira Constituição a consagrar expressamente a fiscalização da inconstitucionalidade por omissão foi a iugoslava de 1974 (art. 377), daí alcançando a portuguesa de 1976 (art. 283, com a redação dada pelas Revisões de 1982 e 1989), a brasileira (art. 103, § 2º) e angolana de 1992 (arts. 134, alínea c e 156). Também a prevêem a Lei da Jurisdição Constitucional da Costa Rica e a Lei do Tribunal Constitucional da Hungria (Cf. Jorge Pereira da Silva, Dever de legislar e protecção jurisdicional contra omissões legislativas, Lisboa: Universidade Católica Portuguesa, 2003, p. 99).

[34] No Direito alemão, o art. 93, 4, a, da Grundgesetz, contempla a (die) Verfassungsbeschwerde (reclamação constitucional), de competência do Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional Federal), cabível na hipótese de violação, pelo Poder Público, aos direitos fundamentais, ao direito de resistência, ao tratamento igualitário nos distintos entes da Federação, ao direito de sufrágio, ao juiz legal (natural), às garantias do processo penal e ao direito de todo indivíduo de somente ter a sua liberdade violada com a observância do devido processo legal. Embora a Grudgesetz não faça menção à natureza do ato, se omissivo ou comissivo, a Lei do Tribunal Constitucional Federal dispôs que, “na motivação da reclamação, é necessário indicar o direito cuja violação se alega, assim como a acção ou a omissão do órgão ou da autoridade pela qual o requerente se considera lesado” (§ 92), tendo acrescido que se a “reclamação constitucional for admitida, a decisão deve indicar a disposição da Lei Fundamental violada e a acção ou omissão que produziu essa violação”. Ao final, exercido o controle concreto de constitucionalidade e detectada a omissão legislativa, o Tribunal pode meramente reconhecer a sua inconstitucionalidade ou fazer um apelo ao legislador para que a supra (Cf. Ilse Staff, Verfassungsrecht, Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 1976, pp. 89/90; e Jorge Pereira da Silva, op. cit., pp. 109/120).

[35] Em Portugal, nos vinte e cinco anos que se seguiram à Constituição de 1976, somente em quatro casos (três deles anteriores a 1982) os órgãos de fiscalização deram por verificada a inconstitucionalidade por omissão, sendo que, de 1995 a 2001, nenhuma decisão foi proferida. Cf. Jorge Pereira da Silva, op. cit., p. 156. No Brasil, da promulgação da Constituição de 1988 a setembro de 2005, foram ajuizadas noventa e quatro ações diretas de inconstitucionalidade por omissão.

[36] Acórdão nº 15/1982, apud José Julio Fernández Rodriguez, La inconstitucionalidad por omisión. Teoria general. Derecho Comparado. El caso español, Madrid, 1998, pp. 428 e ss.

[37] Observa Jesús González Pérez (Administración pública y moral, Madrid: Cuadernos Civitas, 1995, pp. 37/38) que determinada concepção moral, por constituir um direito inalienável do homem, legitima a negativa de atuar contra as suas crenças e convicções, não tendo seu âmbito de incidência restrito à negativa de prestação do serviço militar. Na linha do seu pensamento, invoca o Acórdão nº 53/1985, do Tribunal Constitucional espanhol, conhecido como acórdão sobre a legalização do aborto, segundo o qual “cabe señalar, por lo que se refiere al derecho a la objeción de conciencia, que existe y puede ser ejercido con independencia de que se haja dictado o no la regulación. La objeción de conciencia forma parte del contenido del derecho fundamental a la libertad ideológica y religiosa reconocido en el artículo 16.1 de la Constitución, es directamente aplicable, especialmente en matéria de derechos fundamentales.”  

[38] Acórdão nº 31/1994, apud José Julio Fernández Rodriguez, op. cit., pp. 428 e ss.

[39] Cf. Paulo Otero, Legalidade e Administração Pública, O Sentido da Vinculação Administrativa à Juridicidade, Coimbra: Livraria Almedina, 2003, pp. 25/26.

[40] Como omissão absoluta, pode ser mencionada, à guisa de ilustração, a não edição de lei que discipline a proteção do trabalhador em face da automação (art. 7º, XXVII, da Constituição brasileira).

[41] Acórdão nº 88/1995, apud José Julio Fernández Rodriguez, op. cit., pp. 428 e ss.

[42] A Constituição brasileira (art. 5º, LXXI) contempla o denominado mandado de injunção, passível de ser concedido “sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos Direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. A literalidade do preceito não deixa margem a dúvidas: à falta de norma geral, cabe ao Judiciário a imediata edição da norma individual. Cf. Willis Santiago Guerra Filho, Processo Constitucional e Direitos Fundamentais, 4ª ed., São Paulo: RCS Editora, 2005, pp. 137/156. No Direito comparado, não é encontrada uma figura que congregue o poder de o órgão jurisdicional, suprindo a omissão legislativa, editar um padrão normativo primário e determinar a sua imediata execução: são encontradas figuras afins, normalmente restritas à expedição de provimentos mandamentais, de natureza negativo-proibitiva, destinadas a assegurar a integridade das normas constitucionais. No Direito francês, merecem menção a atuação do: a) Médiateur de la Republique, espécie de Ombudsman, que pode expedir uma injonction (ordem), fixando prazo para que a autoridade responsável cumpra uma decisão coberta pela coisa julgada, redundando, o descumprimento, em publicação de relatório no Journal Officiel, o que tornará pública a negativa; e b) juiz administrativo, que anteriormente ao trânsito em julgado, não pode expedir injonctions à Administração visando ao cumprimento de obrigações de fazer e de não-fazer, devendo limitar-se às injonctions d´instruction, voltadas à produção de provas no respectivo procedimento (Cf. René Chapus, Droit Administratif Général, Tome 1, 15ª ed., Paris: Montchrestien, 2001, pp. 466, 815/816 e 820/821). No Direito espanhol, tem-se o recurso de amparo (havendo grande celeuma quanto à sua natureza jurídica: recurso ou ação de competência originária), que pode ser ajuizado por “toda persona natural o jurídica que invoque un interes legítimo, así como el Defensor Del Pueblo y el Ministério Fiscal” (art. 162, 2, da Constituição) e pressupõe o esgotamento das vias ordinárias (arts. 43 e 44 da LOTC), tendo por fim assegurar a preeminência dos direitos fundamentais e das liberdades públicas violados por atos de autoridades públicas (Balaguer Callejón et alli, Derecho Constitucional, vol. I, 2ª ed., Madrid: Tecnos, 2003, pp. 243/249). No Direito alemão, tem-se a (die) Verfassungsbeschwerde (reclamação constitucional), já mencionada, cuja utilização não tem avançado no sentido de ensejar a edição da norma individual. No Direito português, somente é contemplada a fiscalização de inconstitucionalidade por omissão, de natureza abstrata e concentrada, não havendo instrumento voltado à tutela dos direitos individuais que se assemelhe ao mandado de segurança e ao mandado de injunção do Direito pátrio (Cf. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo VI, Coimbra: Coimbra Editora, 2001, pp. 272/294). No Direito inglês, enquanto as prerrogative orders autorizam as Cortes a exercerem uma jurisdição de supervisão sobre os tribunais inferiores e demais autoridades públicas, a injunction é um remédio eqüitativo (equitable remedy) disponível em todos os ramos do Direito, público e privado, para proteger os direitos da pessoa contra infrações não amparadas pela lei, acrescendo-se que o Human Rights Act de 1998 (art. 12), dispõe sobre o procedimento a ser seguido na concessão, pelos tribunais, das interim injunctions, voltadas à garantia da liberdade de expressão (Cf. A. W. Bradley e K. D. Ewing, Constitutional and Administrative Law, Harlow: Pearson Education, 2003, pp. 731e 421). No Direito norte-americano, o writ of injunction, originário da jurisdição por eqüidade e que tem substituído o writ of mandamus - voltado à efetivação de normas constitucionais específicas (sentido positivo), estando em desuso - consubstancia uma ordem endereçada às autoridades públicas ou aos particulares e que visa a obstar violações a direitos individuais (sentido negativo), encontrando o seu fundamento nas Emendas Constitucionais nº 5 e 14, que também contemplam a cláusula do due process of law (Cf. Ellen Alderman e Caroline Kennedy, In Our Defense, Nova Iorque: Avon Books, 1998, pp. 183/188; e Maria Chaves de Mello, Dicionário Jurídico, 3ª ed., Lisboa: Dinalivro, 2002, p. 341). Volvendo ao Direito brasileiro, vale mencionar que o Supremo Tribunal Federal, embora reconhecendo a eficácia plena da norma que contempla o mandando de injunção, logo, não estando dependente da edição de legislação integradora (MI nº 107, rel. Min. Moreira Alves, j. em 23/11/1989, RTJ nº 133/11), isto sem olvidar a aceitação do mandado de injunção coletivo (MI nº 144, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 03/08/1982, DJU de 28/05/1993), tem dispensado uma interpretação excessivamente tímida ao instituto. O Tribunal exige que a omissão inconstitucional persista por um razoável lapso temporal (MI nº 361, rel. Min. Néri da Silveira, j. em 08/04/1994, DJU de 17/06/1994) e não admite a concessão de medida liminar (MI nº 553, rel. Min. Celso de Mello, j. em 13/05/1997, DJU de 16/06/1995), restringido, em regra, o alcance do provimento jurisdicional à mera declaração da omissão inconstitucional, abstendo-se de supri-la com a edição da norma individual (MI nº 585/TO, rel. Min. Ilmar Galvão, j. em 15/05/2002, DJU de 02/08/2002 – direito de greve dos servidores públicos, art. 37, VII, da CR/1988; MI nº 584/SP, rel. Min. Moreira Alves, j. em 29/11/2001, DJU de 22/02/200, MI nº 587, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 03/10/2001, DJU de 31/10/2001 e MI nº 588, rel. Min. Ellen Gracie, j. em 03/10/2001, DJU de 14/12/2001 – taxa máxima de juros, art. 192, § 3º, da CR/1988; MI nº 95, rel. Min. Carlos Velloso, j. em 07/10/1992, DJU de 18/06/1993 – direito ao aviso prévio proporcional, art. 7º, XXI, da CR/1988; e MI nº 219, rel. Min. Octávio Gallotti, j. em 22/08/1990, DJU de 22/08/1990 – número de representantes de cada unidade federativa na Câmara dos Deputados, art. 45, § 1º, da CR/1988). Essa interpretação, que estimula o surgimento de uma verdadeira simbiose entre o mandado de injunção e a ação de inconstitucionalidade por omissão, aniquilando qualquer possibilidade de eficácia social do primeiro, ao que se soma a já recorrente ineficácia da segunda, sofreu pequeno aperfeiçoamento, tendo o Tribunal avançado ao reconhecer a possibilidade de fixação de prazo para que o Legislativo supra a omissão, ao término do qual, a depender da hipótese, poderá o interessado gozar do direito (MI nº 232, rel. Min. Moreira Alves, DJU de 27/03/1992) ou postular a indenização pelos danos sofridos (MI nº 283, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 20/03/1991, DJU de 14/11/1991 – anistia e direito a reparação econômica, art. 8º, § 3º do ADCT da CR/1988). Em momento posterior, por persistir a ausência de regulamentação do direito referido no art. 8º, § 3º do ADCT da CR/1988, “o Tribunal decidiu assegurar, de plano, o direito à indenização, sem constituir em mora o Congresso Nacional, para, mediante ação de liquidação, independentemente de sentença de condenação, a fixar o valor da indenização” (MI nº 543, rel. Min. Nélson Jobim, j. em 26/10/2000, DJU de 24/05/2002).  

[43] Nas palavras de Aristóteles (A Política, tradução de Roberto Leal Ferreira, São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 53), “não é apenas para viver juntos, mas sim para bem viver juntos que se fez o Estado...”.

[44] Cf. Leopoldo Elia, Le sentenze additive e la piú recente giurisprudenza della Corte Costituzionale, in Scritti su la Giustizia Costituzionale in onore di Vezio Crisafulli, I, Padova, 1985, pp. 302 e ss.

[45] Cf. Vezio Crisafulli, Lezioni di Diritto Costituzionale, 5ª ed., Verona: CEDAM, 1998, pp. 367/375.

[46] Cf. Jorge Pereira da Silva, op. cit., p. 213.

[47] Cf. Jorge Pereira da Silva, op. cit., p. 213.

[48] Cf. Leopoldo Elia, op. cit., p. 320.

[49] Como observa Jorge Miranda (Manual de Direito Constitucional, Tomo II, Coimbra: Coimbra Editora, 2003, p. 250), “os prin­cí­pios não se colo­cam, pois, além ou acima do Direito (ou do pró­prio Direito posi­ti­vo); tam­bém eles – numa visão ampla, supe­ra­do­ra de con­cep­ções posi­ti­vis­tas, lite­ra­lis­tas e abso­lu­ti­zan­tes das fon­tes legais – fazem parte do com­ple­xo orde­na­men­tal. Não se con­tra­põem às nor­mas, contrapõem-se tão-somente aos pre­cei­tos; as nor­mas jurí­di­cas é que se divi­dem em normas-princípios e normas-disposições.”

[50] Neste sen­ti­do, Ronald Dworkin, Taking Rights Seriously,17ª ed., Massachusetts: Harvard University Press, 1999; e Robert Alexy, Theorie der Grundrechte, Baden-Baden: Suherkamp, 1994.

[51] Taking Rights Seriously, p. 24.

[52] Theorie der Grundrechte, pp. 75 e ss.

[53] A afir­ma­ção de que os prin­cí­pios podem ser cum­pri­dos em dife­ren­tes graus resul­ta do fato de não vei­cu­la­rem man­da­dos defi­ni­ti­vos. Assim, o coman­do que deles ini­cial­men­te deflui pode ser afas­ta­do por razões opos­tas, sendo que a solu­ção deste con­fli­to não é iden­ti­fi­ca­da a prio­ri, varian­do gra­da­ti­va­men­te con­for­me os valo­res em jogo no caso con­cre­to.

[54] Nas pala­vras de Alexy, in “Colisão de Direitos Fundamentais e Realização de Direitos Fundamentais no Estado de Direito Democrático” (RDA 217/75), “prin­cí­pios e pon­de­ra­ções são dois lados do mesmo obje­to. Um é do tipo téorico-normativo, o outro, meto­do­ló­gi­co. Quem efe­tua pon­de­ra­ções no direi­to pres­su­põe que as nor­mas, entre as quais é pon­de­ra­do, têm a estru­tu­ra de prin­cí­pios e quem clas­si­fi­ca nor­mas como prin­cí­pios deve che­gar a pon­de­ra­ções. A dis­cus­são sobre a teo­ria dos prin­cí­pios é, com isso, essen­cial­men­te, uma dis­cus­são sobre pon­de­ra­cão”.

[55] Theorie der Grundrechte, p. 78.

[56] Nas palavras de Henry J. Abraham (The Judicial Process, New York-Oxford: Oxford University Press, 1986, p. 8), o common law é “judge-made, bench-made law, rather than a fixed body of definite rules such as the modern civil law codes.”

[57] Cf. Victoria Iturrale Sesma, El Precedente em el Common Law, Madrid: Editorial Civitas, 1995, p. 33.

[58] Cf. René David, Os grandes sistemas do direito contemporâneo, trad. de Hermínio A. Carvalho, São Paulo: Martins Fontes, 1986 p. 120.

[59] No Direito espanhol, o art. 5.1 da Lei Orgânica do Poder Judiciário dispõe que os juízes e tribunais, por estarem vinculados à Constituição, “interpretarán y aplicarán las leyes y los reglamentos según los preceptos y princípios constitucionales, conforme a la interpretación de los mismos que resulte de las resoluciones dictadas por el Tribunal Constitucional en todo tipo de procesos”.


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